Um dos políticos mais próximos de Lula (PT), o senador Jaques Wagner (PT-BA) minimiza os possíveis impactos eleitorais de episódios relacionados à saúde do presidente e diz que essa questão “não será uma variável” para definir uma candidatura em 2026. “Será uma decisão pessoal dele”, afirma, em entrevista à Folha.
Embora seja um firme defensor da renovação em seu partido, o político baiano mantém a candidatura de Lula como plano A. “No quadro de hoje, o candidato é ele.”
Líder do governo no Senado, o parlamentar avalia ainda que a desconfiança manifestada por investidores nas discussões sobre a contenção de despesas “tem um tempero de luta política”. Ele acrescenta que não vê irresponsabilidade fiscal por parte do presidente e pondera que esse não é um conceito absoluto.
“Tem que ser um equilíbrio entre gastos ou investimentos e o bem-estar das pessoas. Eu não sonho com a Argentina. A Argentina, nesse momento, pode ser o sonho dos financistas. Para mim, não é o país ideal.”
Apesar do discurso de responsabilidade e de medidas como o pacote fiscal, existe a percepção de que o governo tem dificuldade para equilibrar as prioridades políticas e controlar despesas para conter a expansão da dívida. Que caminho será tomado nos próximos dois anos?
O esforço que está sendo feito pelo governo é muito grande. Acho que tem que ser um equilíbrio entre gastos ou investimentos e o bem-estar das pessoas. Eu não sonho com a Argentina. A Argentina, nesse momento, pode ser o sonho dos financistas. Aumento violento da miséria, de gente sem casa. Esse, para mim, não é o país ideal. ‘Oh, que finanças lindas, oh, que povo sofrido.’
Nós pegamos o país com o lado social totalmente depauperado. Se poderia investir mais paulatinamente para a recuperação disso, é uma crítica que se pode fazer. Mas é o compromisso central do presidente. Eu não acho em hipótese nenhuma que haja irresponsabilidade fiscal. Nós melhoramos a receita. Mas o único discurso que eu ouço aqui é de continência à chamada responsabilidade fiscal. Eu acho que nenhum conceito é absoluto, exclusivo.
O sr. diz que a responsabilidade fiscal não pode ser naturalmente o único comando do governo, mas a pergunta é: dadas as diretrizes do presidente, o aumento da dívida é algo que deveria ser naturalizado para atingir esses objetivos?
Vou repetir que a dívida continua no padrão do governo anterior vis-à-vis o PIB. Agora, nós aumentamos receita e aumentamos despesa. O Brasil está crescendo. Tivemos que contingenciar quanto do PAC? R$ 20 bilhões. O PAC é a alma do presidente. Alguém dizer que essa pessoa não tem responsabilidade fiscal quando num programa central dele corta R$ 20 bilhões…
O líder da oposição disse [na aprovação do pacote] ‘eu acho tímido, mas está no caminho certo’. Bom, se está no caminho certo, os conceitos não estão largados. O volume, quem tem que graduar, é o presidente. E ele vai ter as consequências. Se ele errar a mão, pode chegar não tão bem em 2026.
O sr. está convencido de que esse momento de turbulência do dólar e dos juros tem um viés político?
É um dos componentes do momento. Não estou dizendo que é só isso. Estou dizendo que tem um tempero que é a luta política. Seria ingênuo da minha parte achar que as coisas são só por convicções teóricas, de economia. Tem isso e, se o cara puder tirar uma lasquinha, vai tirar.
Que tipo de dificuldade isso pode criar para o governo? A questão da inflação, especificamente.
Vou continuar dizendo que hoje tem um componente ideológico muito mais forte do que já teve em eleições anteriores. Mas tem a questão da prosperidade que, na minha opinião, continua sendo o elemento puxador, o bem-estar das pessoas. É preciso que a gente também olhe o seguinte: Lula foi presidente pela primeira vez em 2003. De lá para cá, são 22 anos. Muita gente que está votando agora já nasceu nesse território, com muitas das coisas que foram inovadoras. A gente precisa encontrar uma narrativa que mostre que a gente é uma locomotiva andando para frente e não vivendo do passado.
Há também uma crítica de que faltam quadros jovens no PT.
Acho que o partido passa por um problema de renovação. Eu sou um obsessivo da renovação, fiz isso na Bahia.
Que avaliação o sr. faz sobre a questão de saúde do presidente, que levantou o debate sobre 2026?
Para você ver como a luta política entra em tudo. Ele, para 79 anos, é um cara muito bem conservado. Corre, joga futebol, está melhor que eu, super inteiro. No entanto, porque ele teve um problema que qualquer um pode ter, e que por azar a queda provocou o que provocou, aí sobe a Bolsa, desce a Bolsa. Pelo amor de Deus, gente. Chega a ter um requinte de crueldade, Muita gente deve ter ganhado dinheiro com a doença dele.
Não acho que pelo lado da saúde é o problema. A decisão será muito pessoal dele, se ele quer se oferecer para mais quatro anos. Ele é um animal político. Eu diria para vocês: saúde para mim não será uma variável de decisão, definitivamente.
Qual será?
Será uma decisão pessoal dele.
Imagino que a circunstância política também seja uma variável.
Se a circunstância política não estiver boa, provavelmente ele terá mais ímpeto de vir para a eleição, e não o contrário. Pode ser até que ele diga assim: estamos nadando de braçada, 70%, 60% de avaliação [positiva], está na hora de renovar. Se você perguntar: o que você acha? Eu acho que ele vai ser.
Os 70% de aprovação parecem muito longe, diante do que as pesquisas vêm colhendo.
As pessoas estão atrás de, sei lá, uma liderança meio fanatizante. Há uma descrença com a política em geral, não é com este governo. Falei de uma possibilidade, mas também acho que ninguém mais, nessa quadra em que a gente está, vai ter 70% em disputas maiores. A avaliação do governo pode subir. Se estiver em 50%, acho que ele pode se arriscar. Mas, na minha opinião, sinceramente, com o quadro de hoje, o candidato é ele.
Por que o governo tem tido dificuldade para melhorar a avaliação?
Falta uma narrativa mais qualificada do que a gente está fazendo; é a sensação de muita gente. E é até uma certa agonia do presidente, por achar que não é dado conhecimento total às pessoas daquilo que está sendo feito de maneira positiva, ou seja, a famosa narrativa. A gente ainda não encontrou como grupo político uma embocadura disso aí.
Essa avaliação deve levar o presidente a fazer alguma mudança na área da comunicação?
Essa já está explícita. Até a narrativa disso foi ruim.
Mas qual será o tamanho dessa reforma ministerial?
Na última vez em que falei com o presidente, ele disse: ‘Não vou fazer uma reforma, vou fazer mudança’. Vai ter um ajuste de base, pode ter mudança dentro do mesmo partido, dependendo do desempenho de cada um, pode sair alguém do partido X e entrar alguém do Y, se ele entender que precisa acomodar. Em tese todos os partidos ditos da base estão representados. Se algum partido novo pleitear entrar na base de governo, evidentemente terá que ter acomodação. Onde será feita a acomodação? Para o bem e para o mal, sempre é mais fácil fazer a acomodação com os da casa.
Do PT, no caso.
Há mais facilidade dentro de casa do que com os amigos que estão participando da caminhada. Tem o presidente do Senado, que está saindo, tem o presidente da Câmara. Vi nos jornais que ele pretende ter uma conversa com os dois. São dois players [jogadores] importantes, têm as suas lideranças. Não estou dizendo que vai ter isso, estou dizendo que são elementos que podem movimentar o tabuleiro. Ele deve estar refletindo.
Há quatro ministros senadores. Quer que eles voltem para o Senado nessa reforma?
Acho que não tem uma regra geral. Não quero impor minha opinião, mas eu acho que quem vai lá e pede voto para ser senador deveria exercer. Agora, essa decisão é estritamente do presidente. A variável é essa: desempenho, necessidade política e arrumação da base. Pode ser que um ou dois senadores voltem.
RAIO-X | Jaques Wagner, 73
Senador pelo PT, é líder do governo no Senado e amigo de Lula. Foi ministro do Trabalho e das Relações Institucionais, nos governos Lula, ministro da Defesa e da Casa Civil, no governo Dilma Rousseff, e governador da Bahia.