O filme “Ainda Estou Aqui“, de Walter Salles, baterá a casa dos 2 milhões de espectadores. Ele conta o sofrimento da família do ex-deputado Rubens Paiva, preso em janeiro de 1971, em sua casa, no Leblon, e levado para o DOI da rua Barão de Mesquita.
Segundo a versão divulgada pelos comandantes militares da época, Paiva foi sequestrado por parceiros enquanto era transferido.
Tudo mentira.
Desde 1986 sabe-se que o tenente-médico Amílcar Lobo foi levado ao DOI na madrugada de 21 de janeiro e, numa cela, examinou Rubens Paiva. Nas suas palavras:
“Ele era uma equimose só. Estava roxo da ponta dos cabelos à ponta dos pés. Ele havia sido torturado, mas, quando fui examiná-lo, verifiquei que seu abdômen estava endurecido, abdômen de tábua, como se fala em linguagem médica. Suspeitei que houvesse uma ruptura do fígado ou do baço, pois elas provocam uma brutal hemorragia interna.
[…]
Fiquei na cela com ele durante uns 15 minutos. Durante todo o tempo ele esteve deitado. Estava consciente. Não gemia. Disse só duas palavras:
Rubens Paiva. Eu nunca havia ouvido esse nome, não sabia quem era.
[…]
— No dia seguinte, ou melhor, no mesmo, dia, quando cheguei ao quartel, um oficial me falou:
— Olha, aquele cara morreu.
Eu ainda perguntei:
— Vocês chegaram a levá-lo para o hospital?
— Não, morreu aqui mesmo”.
As últimas horas de Rubens Paiva estão parcialmente reconstituídas e, com elas, as patranhas dos comandantes militares.
O major José Antônio Nogueira Belham, que comandava o DOI no dia 21 de janeiro, diz que estava de férias. Tudo bem, mas naquele dia ele assinou o recibo dos objetos que o preso tinha ao chegar ao quartel: duas canetas, um relógio Movado a 260 cruzeiros.
Durante sua passagem pelo DOI desapareceram outras nove pessoas.
Como ensinou Guimarães Rosa, as pessoas não morrem, ficam encantadas. Rubens Paiva ainda está aqui.
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