Maria Emília, moçambicana, está em Portugal com um filho “especial”, como ela própria diz, e veio receber duas sobrinhas e a irmã, “que já têm passagem para voltar”.
À chegada, os abraços são longos e a irmã confirma o que ela já tinha relatado à Lusa enquanto esperava: “Não tem sido fácil gerir as falhas”, com dificuldades em deslocar-se, em conseguir comprar o que faz falta.
“Não é fácil, mas estão a conseguir gerir”, repete Maria Emília, para quem o mais difícil é “acompanhar de longe” quando lá deixou “dois filhos, marido” e outros familiares.
Valdir, que chegou a Lisboa para uma visita, também já programada, a parte da família, diz que “todas as pessoas conhecidas estão em segurança. Mas muitas em estado de pânico”.
“É difícil sair de casa, há bloqueios nas estradas”, relata, mas ainda assim, pretende “em princípio, ficar apenas o tempo planeado”, em Lisboa.
À espera do neto, de 18 anos, uma senhora que preferiu não ser identificada, lamenta não ter conseguido convencer o filho, que vive em Moçambique há mais de 20 anos, a vir também.
“Vai continuar lá. O meu neto vem para cá estudar. Eu queria que o meu filho viesse, mas ele não vem. Acredita que a situação se vai resolver”, diz à Lusa, enquanto aguardava longas horas pelo voo que chegou com quase duas horas de atraso.
Também Rui Carvalho, que vive “lá e cá”, espera que a situação se resolva em breve porque quer voltar.
Espera a mãe da filha, esta a estudar em Portugal, e denuncia que os protestos que se vivem desde que foram conhecidos os resultados das eleições gerais de 09 de outubro são porque “a democracia, a voz do povo, não está a ser respeitada”.
A situação atual é “pior do que as que se viveram antes” em situação pós-eleitoral, mas “isto é cíclico”, refere.
“Tenho muitos amigos e familiares lá. Não pensam vir”, afirma à Lusa, mas “a realidade é que o país está a sofrer, ninguém está satisfeito, as pessoas não conseguem fazer o seu dia a dia em segurança”.
“Os factos estão em cima da mesa”, refere, convicto de que houve fraude eleitoral, e por isso considera que era “importante que os políticos daqui ajudassem a repor a verdade e só a verdade”.
Fala de “hipocrisia” e questiona “para que são as eleições”, se depois o resultado “é manipulado”.
Pelo menos 261 pessoas morreram nas manifestações pós-eleitorais em Moçambique desde 21 de outubro, metade das quais desde o anúncio pelo Conselho Constitucional (CC) dos resultados finais, na segunda-feira, segundo o mais recente balanço da plataforma eleitoral Decide.
O CC proclamou Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder), vencedor da eleição a Presidente da República, com 65,17% dos votos, sucedendo no cargo a Filipe Nyusi, bem como a vitória da Frelimo, que manteve a maioria parlamentar, nas eleições gerais de 09 de outubro.
Este anúncio agravou o caos no país, com manifestantes pró-Venâncio Mondlane – que obteve 24% dos votos segundo o CC, mas desde o início contesta os resultados – em protesto nas ruas, com barricadas, pilhagens e confrontos com a polícia, que realiza disparos para tentar a desmobilização.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros, citado na sexta-feira pelo jornal Público, indicou haver “cerca de 18 mil portugueses registados nos consulados em Moçambique”, mas o número de cidadãos nacionais a residir naquele país africano pode ser bastante superior já que há quem não faça esse registo.
Em setembro de 2022, o ex-primeiro-ministro, António Costa, durante uma visita a Maputo mencionou 40.000 portugueses a viver em Moçambique.
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