Um grupo formado por pais de alunos do colégio Dante Alighieri, um dos mais tradicionais da capital paulista, elaborou uma carta em que critica a maneira como a instituição tratou o fato de uma professora ter exibido em sala de aula um vídeo que faz uso da chamada linguagem neutra.
Como mostrou o Painel, pais e responsáveis pediram explicações a respeito da aula à direção do Dante Alighieri, que respondeu com um comunicado em que lamenta a escolha da docente e diz que “o tratamento editorial de linguagem” não tem correspondência com o “padrão de uso de linguagem adotado institucionalmente pelo colégio.”
A denominada linguagem neutra surgiu com a intenção de representar pessoas não binárias, que não se identificam nem com o gênero masculino nem com o feminino. Seu uso ganhou espaço em ambientes como as redes sociais. Por essa linguagem, a palavra “todos”, por exemplo, pode ser substituída por “todes”.
A utilização da linguagem neutra no vídeo em questão se restringe ao título “Evolução Para Todes” para falar de arqueologia e o estudo do passado. Ele foi produzido pelo Laboratório de Arqueologia e Antropologia Ambiental e Evolutiva da Universidade de São Paulo (USP) (veja abaixo).
Um membro do grupo de pais, denominado Dante Antidiscriminatório, disse ao Painel em caráter reservado que eles se uniram em 2022 com o objetivo de compartilhar angústias e debater boas formas de levar para dentro da instituição a discussão sobre a pauta racial.
A ideia, diz, sempre foi criar uma boa interlocução com o colégio e pensar conjuntamente nas maneiras de discutir questões civilizatórias nas salas de aula.
Na questão da linguagem neutra, esses pais dizem ver de forma bastante crítica o posicionamento recente do colégio.
“O grupo entendeu, em primeiro lugar, que perdeu-se a grande oportunidade de, a partir do debate sobre linguagem neutra, se colocar em discussão junto às alunas e aos alunos as questões centrais de pessoas trans e não binárias que possuem seus direitos básicos e constitucionais negados diariamente em todas as esferas da sociedade brasileira”, afirma a carta, que também foi entregue à instituição.
Em segundo lugar, diz que há preocupação com a exposição pública da professora, que veiculou “material de cunho informativo aos alunos”.
“Mães, pais e cuidadores escolhem, há mais de um século, o colégio Dante justamente pela sua excelência acadêmica e formação crítica, o que só existe com docentes seguros para exercer sua liberdade de ensino em sala de aula, escolhendo com autonomia os materiais que entendem adequados para exposição, a fim de assegurar aos alunos a liberdade de aprendizagem”, acrescenta.
A carta também afirma que as instituições não deveriam “se curvar a reivindicações de base preconceituosa e discriminatória”, pois “opiniões divergentes existem, e justamente essa é a razão para que a escola possa oferecer espaço para a troca de ideias”.
O grupo conclui afirmando que enxerga como reprovável a “resistência da escola em promover o aprofundamento do debate entre alunos e professores” e que não pode haver temas proibidos em uma instituição de ensino que preza por sua tradição e história de qualidade de ensino.”
Em nota à coluna, o colégio disse ser “um espaço democrático de convivência harmônica e amistosa entre todos, respeitando a pluralidade que existe na sociedade e acolhendo toda a diversidade”.
Sobre o ocorrido, afirmou que “a linguagem é um terreno vasto e fluido, que se amolda, com o tempo, às mudanças socioculturais que lhe ditam novas configurações” e que entende que, na atualidade, haja manifestações que utilizem a linguagem neutra.
“Defendemos, no entanto, que qualquer tipo de modificação e atualização deve ser discutida por especialistas, sem ser imposta. Assim como ocorre com o padrão textual jornalístico —do qual a Folha é importante símbolo—, o Dante, baseando-se nas diretrizes da pedagogia hoje vigente no país, utiliza em suas aulas a norma-padrão da língua portuguesa”, finaliza.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.