A Organização Human Rights Watch (HRW) acusou Israel na quinta-feira (19) de “atos de genocídio” contra os palestinos em Gaza ao privá-los de suprimentos adequados de água.
O grupo, em um extenso relatório, descobriu que entre outubro de 2023 e setembro de 2024, as autoridades israelenses privaram os palestinos do que a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma ser a quantidade mínima de água necessária para a sobrevivência em situações de emergência prolongadas.
Isso contribuiu para milhares de mortes e a disseminação de inúmeras doenças, revelou o relatório.
Israel, que negou repetidamente as alegações de genocídio e de uso da fome como arma de guerra, negou também, as últimas acusações da HRW, com um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores declarando que o relatório estava “cheio de mentiras”.
Segundo a OMS, uma pessoa precisa de 50 a 100 litros (13 e 26 galões) de água por dia para garantir que suas “necessidades básicas sejam atendidas”. Em situações de emergência prolongadas, a quantidade mínima de água pode cair para 15 a 20 litros por dia para beber e lavar.
Para os mais de 2 milhões de palestinos que vivem na Faixa de Gaza, até isso está fora de alcance, descobriu a organização. A maior parte ou toda a água à qual os palestinos em Gaza têm acesso não é segura para beber.
Atos de Israel
A HRW afirma que as ações de Israel equivalem a atos de genocídio sob a Convenção sobre Genocídio e o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI).
Ela enfatiza que a privação de água está levando à morte lenta de palestinos em Gaza, incluindo recém-nascidos cujas mães não conseguem alimentá-los devido à desnutrição e desidratação, e estão bebendo fórmula misturada com água suja.
A guerra de Israel em Gaza, lançada após o ataque do Hamas em outubro de 2023, matou mais de 45 mil palestinos e feriu cerca de 106 mil, conforme o Ministério da Saúde Palestino.
A organização alega que a obstrução da água é um ato deliberado das autoridades israelenses, citando a bloquei de Israel à ajuda humanitária, incluindo suprimentos relacionados ao tratamento e produção de água, restrições ao fluxo de água limpa por meio de oleodutos de Israel para Gaza, bem como danos “massivos” à infraestrutura hídrica do território causados por ataques israelenses.
Em janeiro, o Banco Mundial e a Ipsos, uma empresa de pesquisa de mercado, estimaram que quase 60% da infraestrutura de água e saneamento de Gaza havia sido danificada ou destruída por hostilidades. Em agosto, esse número havia subido para 84%.
No mês de julho, soldados israelenses destruíram um reservatório de água crítico que abastecia Rafah, no sul de Gaza.
A explosão foi capturada em um vídeo agora excluído, que teria sido compartilhado por um soldado israelense no Instagram e geolocalizado pela CNN.
Em uma declaração no X, Oren Marmorstein, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel, negou as acusações e disse que Israel havia “facilitado o fluxo contínuo de água e ajuda humanitária” para o território.
Segundo ele, Israel também havia garantido que a infraestrutura de água, incluindo quatro oleodutos e instalações de bombeamento e dessalinização, permanecessem operacionais.
‘Violação descarada do direito internacional’
Israel já enfrentou acusações de usar água como arma de guerra em Gaza.
Pedro Arrojo-Agudo, relator especial da ONU sobre os direitos humanos à água potável e saneamento, explicou em novembro de 2023 que “cada hora que passa com Israel impedindo o fornecimento de água potável na Faixa de Gaza, em violação descarada do direito internacional, coloca os moradores do território em risco de morrer de sede e doenças relacionadas à falta de água potável”.
A crise alimentou doenças em Gaza e causou mortes estimadas em milhares, pontuou a HRW.
A escala da devastação causada pela falta de água provavelmente nunca será totalmente compreendida, alertou a organização, devido à dizimação do sistema de saúde de Gaza, incluindo o rastreamento de doenças.
Dentre elas está a poliomielite, um exemplo de doença viral altamente contagiosa, frequentemente causada por acesso insuficiente a água potável e saneamento.
Os testes da OMS descobriram pela primeira vez o vírus da poliomielite em amostras de esgoto retiradas de tendas superlotadas de pessoas deslocadas por ataques aéreos israelenses em Gaza em julho.
Em 16 de agosto, o Ministério da Saúde palestino confirmou um caso de poliomielite em uma criança de 10 meses — o primeiro caso em Gaza em 25 anos.
Infecções bacterianas como diarreia se tornaram comuns no enclave devido ao consumo de água contaminada.
Descrevendo o impacto de ser forçado a beber de um poço sujo, um homem disse à HRW, “eu estava ficando doente, meus filhos estavam vomitando e tinham diarreia, e eu também tinha. Isso foi a partir do momento em que começamos a beber a água (suja)”.
O relatório da organização surge enquanto um acordo de cessar-fogo entre Israel e Hamas continua ilusório, embora as negociações pareçam ter tomado um rumo mais positivo nos últimos dias.
Em uma declaração oficial na terça-feira (17), o Hamas falou que chegar a um acordo era “possível”. Uma fonte do grupo acrescentou que as negociações foram “positivas e otimistas”. No entanto, alertaram que os obstáculos permanecem.
Tanto a equipe israelense quanto a do Hamas estão na capital do Catar para negociações indiretas.