O Coletivo Mato do Júlio e a Comissão dos Moradores do Parque da Matriz realizaram no último sábado (21) um ato em Defesa da Floresta do Mato do Júlio, no Parcão de Cachoeirinha. O abraço coletivo em torno do local reuniu cerca de 400 pessoas. De acordo com os organizadores, a área de 256 hectares de floresta nativa ajudou a segurar a enchente em maio. Atualmente eles temem de que a mesma seja desmatada por conta da especulação imobiliária. O destino do local há anos segue indefinido.
“O Mato do Júlio é a maior reserva ecológica da Grande Porto Alegre e na enchente de maio de 2024 atuou como uma esponja natural, evitando uma tragédia maior. Segundo alguns estudos, na inundação de maio, o Mato do Júlio salvou entre 6 a 8 mil pessoas de serem atingidas pelas águas. O Mato do Júlio é um refúgio climático e ambiental indispensável para a região Metropolitana”, destaca nota das entidades enviada ao prefeito Cristian Wasem (MDB).
No documento, é solicitado que o Executivo municipal dê prioridade aos estudos e obras de contenção para evitar novas enchentes e preserve a Floresta do Mato do Júlio. Assim como reafirma o pedido de isenção do IPTU para todos os moradores que tiveram as casas inundadas no mês de maio, como foi concedido aos moradores afetados pelas cheias em Porto Alegre, Canoas e São Leopoldo.
A área recebe esse nome por conta de seu último morador, Júlio Baptista, que viveu até sua morte, em 2002, no casarão construído em 1814. Júlio era um dos herdeiros do Comendador João Baptista Soares da Silveira e Souza, que quando criança veio dos Açores para o Brasil e recebeu as terras que tornaram-se a Fazenda da Cachoeira, que deu origem ao município de Cachoeirinha.
Conforme reportagem realizada pelo Brasil de Fato RS, em junho, nos últimos anos a construção de um condomínio quase foi aprovada no local após tentativas de alteração do Plano Diretor, frustradas pela luta popular. As entidades da região pedem que o território de propriedade privada seja desapropriado pelo Governo Federal, como medida para minimizar os efeitos das mudanças climáticas.
Rodeada de bairros populosos, a área contribui para reduzir o impacto das enchentes na Região Metropolitana de Porto Alegre por sua característica de retenção hídrica junto à várzea do rio Gravataí, aponta a matéria.
Morador do Parque da Matriz há dois anos, e integrante da Comissão de Moradores, Eleneu Portela atesta a capacidade de retenção, uma vez que sem ela a situação seria pior. Também chama atenção para a situação do Arroio Passinho, que cruza o Mato do Júlio. “Aqui no bairro Parque da Matriz, nós temos dois grandes problemas. O primeiro problema, que já vem há quase 30 anos, é o alagamento do Arroio Passinho que cruza o Mato do Júlio. Quando ele chega na Freeway, os canais que estão embaixo dela não dão vazão com a quantidade de água que chega nele. O segundo problema é o da inundação do rio Gravataí, que foi o que ocorreu em maio.”
A Comissão de Moradores existe desde janeiro deste ano quando um temporal atingiu o município, destelhando várias casas e alagando o arroio. Na ocasião os moradores se mobilizaram, e na enchente de maio, partiu deles a organização e o auxílio aos atingidos.
“Cobramos tanto o governo federal como a prefeitura acerca do auxílio emergencial, a limpeza dos entulhos e a limpeza do arroio, uma vez que fazia anos que o mesmo não era limpo.”
De acordo com o morador, até o final deste ano o Executivo municipal não apresentou um estudo prévio para que se evite alagamento, tanto do arroio, quanto do rio Gravataí, e que se estaria discutindo no Conselho do Plano Diretor, a liberação de zoneamento em uma área que atingiria o Mato do Júlio.
“Estamos nessa caminhada, pedindo para o prefeito que não utilize o Mato do Júlio. Se tu hoje libera o zoneamento lá em cima, a água vai vir mais rápido, porque como vai ser concreto, a água não vai impermeabilizar, vai vir rápido a água do arroio e consequentemente vai alargar as ruas mais rapidamente. Nós ficamos cobrando a prefeitura, porque se não tem nem estudos, projetos e obras para evitar tanto alagamento do Arroio Passinho, como também da ação do rio Gravataí, como é que eles já querem ainda piorar nossa situação?”, questiona.
Mobilização
A mobilização em defesa do Mato do Júlio acontece desde 2020. De acordo com a coordenadora do Coletivo Mato do Júlio, Luana Almeida de Oliveira, foi realizada uma reunião com o Conselho do Plano Diretor, e que estão no aguardo de uma nova agenda, assim como uma audiência pública, ainda sem data definida. O movimento também está realizando coleta de assinaturas em defesa do local.
“O Mato do Júlio é o pulmão de Cachoeirinha e da Região Metropolitana de Porto Alegre, uma floresta de Mata Atlântica de 256 hectares, com diversas espécies de animais como Graxaim-do-mato, Mão-pelada, Ouriço, Gambá e até mesmo um animal ameaçado de extinção, o Gato-do-mato-pequeno (Leopardus guttulus). Além disso, sabemos que durante a enchente de maio, cerca de 35% da água que deixou 25 mil pessoas desabrigadas ficou dentro do mato, por conta disso, se não houvesse o mato, entre 5 a 9 mil pessoas a mais teriam sido afetadas pela enchente. O Mato do Júlio tem que ser olhado com seriedade e responsabilidade, porque essa área além de melhorar a qualidade do ar, diminuir a temperatura da cidade, ela segurou grande quantidade de água da enchente”, destaca o texto da petição online.
De acordo com Luana, o ato do último sábado (21) aconteceu como protesto pela derrubada de árvores no local e a tentativa de mudança do Plano Diretor para futuras construções na área.
O abraço coletivo reuniu cerca de 400 pessoas, entre elas moradores locais e de outras cidades, parlamentares gaúchos do estado e município, entidades e movimentos sociais. “Fizemos a mobilização para mostrar que as pessoas estão ativas e a gente quer cada vez mais participar das decisões. Queremos preservação de uma forma consciente. Queremos ser ouvidos, a opinião da população importa”, conclui.
O Brasil de Fato RS procurou a prefeitura de Cachoeirinha, o espaço ficará aberto para manifestação.
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Katia Marko