Os novos ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à condução da política monetária pelo Banco Central restabeleceram o pessimismo no mercado brasileiro, com efeitos sobre a Bolsa, o dólar e as taxas de juros futuras.
Na quinta-feira (23), o principal índice da B3, a bolsa braslieira, desabou 2,29% e fechou o dia no menor patamar desde julho de 2022, a 97.926 pontos. O dólar subiu 1,17%, para R$ 5,299, e os juros futuros avançaram: a taxa do Deposito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024, por exemplo, subiu de 13,01% para 13,17%.
“O Copom [Comitê de Política Monetária do BC] mais duro e a intensificação das críticas do governo à atuação do BC alimentaram a aversão ao risco e afastam investidores de ativos locais”, destacou a equipe de análise da Guide Investimentos.
No comunicado em que justificou a manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 13,75% ao ano, na quarta (22), o Copom não deu qualquer indicação sobre redução futura nos juros e ainda ressaltou a possibilidade retomar o ciclo de alta caso as condições se deteriorem.
Por volta de 12h50 desta sexta (24), recuperando parte do terreno perdido na véspera, o dólar caía 0,75%, cotado a R$ 5,25, e a B3 subia 0,81%, aos 98.721 pontos, apesar da deterioração do ambiente financeiro no exterior. A preocupação foi estimulada pela forte queda nas ações do Deutsche Bank na bolsa de Frankfurt (Alemanha).
Relatório do Bradesco observa que os riscos envolvendo o sistema financeiro internacional voltaram ao radar depois de a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, sinalizar que ferramentas emergenciais podem ser utilizadas novamente para resgatar bancos regionais do país, evitando assim possíveis riscos sistêmicos.
Cenário financeiro dominado pela política
Nesta quinta, Lula afirmou que “história julgará” a decisão do Copom. Também reforçou que o Senado é “que tem que cuidar” do presidente do BC, Roberto Campos Neto.
A reação contra a medida do Copom não se restringiu a Lula. Vozes que costumam ser mais moderadas também se manifestaram. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, classificou como “preocupante” o comunicado do Copom.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, disse que manter a taxa de juro em 13,75% é muito radicalismo. “De um lado, você tinha, até pouco tempo atrás, juros de 2%. Agora 13,75%. Eu acho é que precisa ter mais moderação. Não há uma inflação de demanda, pelo contrário. É preciso estimular a atividade econômica”, afirmou.
O head de research da Genial Investimentos, Eduardo Nishio, destacou, em relatório enviado na manhã desta sexta, que o noticiário político continua a impactar os mercados.
Os problemas não se limitam aos ataques ao Banco Central. Também chamou atenção a alegação Lula – desmentida por provas coletadas pela Polícia Federal – de que um plano da facção criminosa PCC seria uma “armação” do senador Sergio Moro (União-PR).
“Localmente, as agruras em relação à deteriorada relação entre o governo e o Banco Central se confundem com a política”, diz Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset. “O desvio de foco e o ataque desproporcional [de Lula] acabam dando força tanto ao senador quanto ao presidente do Banco Central, pois demostram um destempero semelhante, o que não parece de todo normal.”
Para Vieira, os ataques “perderam força e propósito” e obrigam o governo a entregar “algo crível e rápido”, referindo-se ao novo arcabouço fiscal, tido como fundamental para permitir uma redução da taxa de juros.
Prometida para este mês pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a apresentação da regra que substituirá o teto de gastos foi adiada por ordem de Lula. A interpretação do mercado foi de que o presidente considerou o projeto muito austero e quer mais espaço para gastos.
Até então, a intenção de Haddad era de que o arcabouço fosse divulgado antes da reunião do Copom, realizada na terça e quarta, de forma a influenciar a decisão dos diretores do BC.
Inflação dá alívio momentâneo
Um alívio, ao menos momentâneo, veio com a divulgação do IPCA-15, a prévia da inflação, que fechou março em 0,69%. No acumulado de 12 meses, a alta nos preços foi de 5,36%.
“Há uma importante desaceleração em curso da inflação
afetada pela dinâmica menos favorável da atividade econômica e da política
monetária que devem ter seus efeitos intensificados à frente”, diz a
especialista em inflação da Warren Rena, Andréa Angelo.
Embora classifique o número do IPCA-15 como “um sinal de alívio em meio à turbulência”, Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, destaca que as leituras recentes do IPCA mostram uma inflação ainda pressionada.
“Parece cedo para afirmar que o processo de desinflação retomará tração daqui para frente, tendo em vista o cenário de elevação das expectativas inflacionárias, taxa de câmbio depreciada e alguns estímulos de curto prazo à atividade econômica”, disse Margato, em relatório.