Em ofício, deputado diz que justificativa para volta de comissões é “desacerto” que “causa espécie” e “não se mostra coerente”
Em mais uma escalada da tensão institucional no Legislativo, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), desafiou nesta 6ª feira (24.mar.2023) a legalidade do ato do chefe do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que determinou a volta das comissões de MPs (medidas provisórias) e pediu que o assunto seja debatido em uma sessão do Congresso.
Em ofício, Lira afirma que, “do ponto de vista constitucional”, Pacheco “tolheu” o direito dos deputados de contestar a questão de ordem (protesto formal com base nos regimentos do Legislativo) de Renan Calheiros (MDB-AL) pedindo a instalação imediata das comissões ao anunciar a decisão de acatá-la em uma sessão do Senado. Eis a íntegra (977 KB).
Segundo o presidente da Câmara, existe “evidente descompasso” entre a decisão de retomar agora a tramitação das MPs por comissões mistas –com deputados e senadores– e usar como justificativa para isso o fim da emergência sanitária da covid, em 22 de maio de 2022.
“Não parece justificável, um ano depois –ou seja, apenas em 23 de março do corrente ano– que se altere unilateral e monocraticamente o regime de tramitação de medidas provisórias em vigor com base em tais argumentos, mormente quando é de conhecimento público o avançado andamento das tratativas relativas ao tema”, escreve Lira.
O deputado diz, ainda, que “não se mostra coerente” dar tratamentos distintos às MPs assinadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que ainda estão em tramitação e às do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já que todas foram publicadas depois do fim da emergência sanitária que Pacheco usa como justificativa.
No ato em que decidiu retomar as comissões mistas, Pacheco determinou que o sistema regular só valeria da 1ª medida provisória de Lula em diante, e despachou as MPs de Bolsonaro que ainda estão válidas diretamente para o plenário da Câmara, seguindo o rito adotado na pandemia.
“Solicito que Vossa Excelência se digne a convocar sessão do Congresso Nacional, a fim de que a matéria seja formal e devidamente suscitada e decidida, facultando-se, dessa forma, o contraditório com a participação ampla de Senadores da República e também Deputados Federais, com igual dignidade, e também recorrer às respectivas Comissões de Constituição e Justiça, se for o caso”, conclui.
Nos últimos dias, antes de receber a contestação do deputado, Pacheco vinha dizendo que convocaria uma sessão do Congresso na 1ª quinzena de abril.
O ofício de Arthur Lira ao presidente do Senado mostra que o presidente da Câmara está disposto a prolongar a disputa em torno da instalação das comissões mistas de MPs não só com declarações públicas, mas, também, com ações em instâncias formais.
Lira disse recentemente que as comissões de medidas provisórias são “antidemocráticas” em razão de sua composição, com 12 deputados e 12 senadores. Na sua visão, a paridade não representa os plenários das Casas, onde há 513 deputados e 81 senadores.
A análise de MPs por comissões mistas é um comando da Constituição. No início da pandemia, o STF (Supremo Tribunal Federal) deu um salvo-conduto para o Congresso pular essa fase e levar as medidas provisórias diretamente aos plenários da Câmara e, depois, do Senado.
O trâmite abreviado deixou todo o poder sobre a escolha do relator de uma medida provisória e a data de sua votação no plenário com o presidente da Câmara. Senadores reclamam que só conseguiam se debruçar sobre as MPs a dias de perderem a validade, inviabilizando mudanças no texto.
Nas comissões mistas de medidas provisórias, há um rodízio. Deputados e senadores revezam-se na relatoria dos textos.
Sempre que uma Casa ocupa a relatoria, a outra fica com a presidência do colegiado. O sistema também dilui o poder dos presidentes da Câmara e do Senado, já que cabe aos líderes de partidos ou blocos indicar os integrantes que, por sua vez, elegem os relatores e presidentes das comissões.