O Ministério Público Federal (MPF) e o Tribunal Regional Eleitoral do Amapá (TRE-AP) investigam o senador Davi Alcolumbre (União-AP) pelo suposto uso de um jatinho particular em nome da empresa Saúde Link, que tem contratos com o governo do Amapá.
A empresa foi responsável pelo programa Mais Visão, suspenso após o Ministério Público ter apontado irregularidades e um surto de endoftalmite, infecção ocular que pode levar à cegueira — e que afetou 104 pacientes.
Na página inicial da empresa na internet, há um aviso sobre o programa: “O Programa +Visão teve início no começo de 2021, com a iniciativa do senador Davi Alcolumbre em parceria com o Governo do Estado do Amapá”.
Em 2021, o governo estadual contratou o Centro de Promoção Humana Frei Daniel de Samarate por R$ 15,4 milhões durante quatro meses, mediante um termo de fomento. O dinheiro foi pago em três parcelas de R$ 5,1 milhões, conforme o contrato ao qual a CNN teve acesso.
O objetivo da contratação, segundo o documento, era complementar o serviço de saúde pública no estado. Essa ONG contratou a Saúde Link para o programa de catarata.
Neste ano, o senador Alcolumbre destinou R$ 8,6 milhões em emendas parlamentares para a Secretaria de Saúde do Amapá, que contratou a empresa. No ano anterior, foram R$ 6,4 milhões, totalizando R$ 15 milhões em dois anos.
É nesse contexto que entra a investigação do MPF e da Justiça Eleitoral contra Alcolumbre, candidato a presidente do Senado. A investigação foi aberta em 2022, durante a campanha eleitoral.
O MPF apura possíveis atos de improbidade administrativa em relação ao programa Mais Visão. O procedimento é sigiloso e segue em curso.
Já o TRE-AP também investiga especificamente o senador em outra frente: o uso de um jatinho em nome da empresa Saúde Link, beneficiada com emendas parlamentares.
Segundo depoimentos no processo, o senador usa a aeronave para deslocamento entre Brasília e o Amapá, e pousa na fazenda da família. A CNN esteve em Macapá nesta semana e ouviu relatos de políticos que dizem que o senador “só anda de jatinho” no estado.
Documentos da Força Aérea Brasileira (FAB) embasam o processo. Em agosto deste ano, a FAB informou ao TRE-AP as rotas de dois jatos da Saúde Link durante agosto de 2022, na campanha eleitoral.
As planilhas mostram que um deles pousou no aeródromo da família do senador na zona rural de Macapá, nos dias 16 e 17 daquele mês. Era um bimotor para seis passageiros.
A FAB também informou, com documentos, que um outro avião particular da Saúde Link deixou Macapá rumo a Brasília no mesmo dia. No dia seguinte, a aeronave voltou para a capital amapaense.
A investigação em curso apura se o senador usou os aviões particulares para campanha eleitoral. O pedido do processo eleitoral é pela cassação do mandato do senador.
Jatinho apreendido
Um mês antes, em 22 de julho de 2022, um jatinho da empresa Saúde Link, em nome do médico Luciano André Goulart, foi apreendido pela Polícia Federal na fronteira do Brasil com o Paraguai, segundo registros obtidos pela CNN.
Em Ponta Porã (MS), a ocorrência da PF diz que houve “apreensão de mercadoria de origem estrangeira no valor estimado de R$ 50 mil, apreensão de 30 mil reais em espécie e 20 mil dólares [cerca de R$100 mil]”.
Era um voo privado doméstico e os tripulantes relataram que o motivo da viagem à cidade era para turismo. Na aeronave estavam o piloto, o copiloto e dois passageiros, além dos produtos contrabandeados.
O MPF propôs como pena o pagamento de 10 salários-mínimos, algo em torno de R$ 13,2 mil, além dele comprometer-se a não praticar nova infração. Goulart, dono da empresa, concordou e o jatinho foi liberado.
A aeronave apreendida, Hawker Beechcraft, modelo 400A, de prefixo PR-MGD, é a mesma que foi registrada pela FAB em Macapá um mês depois, conforme apuração da CNN no Amapá e em Mato Grosso do Sul.
A equipe do senador Davi Alcolumbre não respondeu aos contatos da reportagem. A CNN procurou a Saúde Link e o governo do Amapá e aguarda retorno.