Desde o anúncio do pacote fiscal do ministro Fernando Haddad, muitos destacam a tal “má vontade dos investidores” em relação ao governo petista. No fundo, essa percepção é fruto de um contexto político e econômico que amplifica a percepção de risco. O ceticismo não é infundado: ele reflete uma série de fatores que, juntos, enfraquecem a credibilidade fiscal e a confiança na capacidade do governo de gerir a economia de forma estável e previsível.
A credibilidade fiscal, que é a confiança de que o governo pode cumprir seus compromissos financeiros sem comprometer a estabilidade econômica, depende de controle rigoroso dos gastos públicos e de uma comunicação clara. No entanto, o governo tem enfrentado dificuldades em ambas as frentes. Internamente, há uma divisão visível entre a ala liderada por Haddad, que busca preservar alguma responsabilidade fiscal, e a liderada por Gleisi Hoffmann, que prioriza o aumento de gastos sem atenção adequada à sua qualidade ou impacto de longo prazo.
Essa divergência, além de amplamente divulgada na imprensa, se materializou no recente anúncio de um tímido pacote fiscal acompanhado de mudanças no Imposto de Renda. A estratégia de unir essas medidas foi interpretada como uma tentativa de minimizar desgastes políticos, mas acabou obscurecendo o comprometimento do governo com a responsabilidade fiscal, gerando confusão em vez de confiança.
O mercado financeiro reagiu de forma negativa. A consultoria Warren Rena estimou que o impacto fiscal será de R$ 45,1 bilhões, bem abaixo dos R$ 70 bilhões projetados pelo Ministério da Fazenda. Essa divergência nas estimativas reforça a percepção de inconsistência e falta de clareza nas políticas econômicas. O banco JP Morgan, por sua vez, previu uma alta de 1 ponto percentual na taxa Selic, que pode alcançar 14,25% em dezembro. Em relatório, o banco afirmou que as medidas apresentadas “falharam em recuperar a credibilidade da política econômica”.
Essa percepção ganhou mais força com a alta histórica do dólar, que fechou em R$ 5,9891, renovando o maior valor nominal da moeda americana. Ao longo do pregão, o dólar chegou a R$ 6, o que deve gerar impactos no custo de vida das famílias. Essa valorização do dólar encarece produtos importados, como alimentos, medicamentos e combustíveis, pressionando a inflação e reduzindo o poder de compra da população, sobretudo a de menor renda.
A comunicação bagunçada agrava o cenário. Estudos como os de Mendonça e Nicolay (2017) mostram que uma comunicação clara e consistente é essencial para alinhar as expectativas do mercado e reduzir incertezas. No entanto, o governo tem se mostrado contraditório. Ora defendendo ajuste fiscal pelo lado da receita e apontando o tamanho dos subsídios e privilégios, ora anunciando novos benefícios sem detalhar como equilibrar as contas públicas. Essa falta de coesão gera dúvidas sobre a capacidade de cumprir o arcabouço fiscal, um conjunto de regras projetado para controlar a dívida pública, consequentemente reduzindo juros e aliviando a inflação.
A “má vontade dos investidores” na prática significa desconfiança. No fim, resultado de um histórico de irresponsabilidade fiscal do grupo político no poder, políticas econômicas inconsistentes e comunicação deficiente. Para reverter esse quadro, o governo precisaria apresentar um plano fiscal robusto, detalhado e focado em reformas estruturais que mostrem compromisso com a solvência a longo prazo. Sem isso, o cenário econômico permanecerá instável, pressionando o custo de vida das famílias e dificultando a retomada da confiança nos mercados.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.