Governo desperdiça bônus e usa trampolim como amortecedor – 28/11/2024 – Bruno Boghossian


O pacote de contenção de gastos do governo tomou um banho de política antes de ver a luz do dia. A decisão de anunciar em conjunto o ajuste fiscal e o aumento da isenção do Imposto de Renda mostrou que Lula não estava disposto a absorver o desgaste que o plano provocaria em sua base social sem, ao menos, preparar terreno para tentar amenizar esse impacto antes da próxima eleição.

O formato do anúncio começou a ser discutido há duas semanas, numa reunião entre Lula e seu marqueteiro. O presidente convocou o publicitário Sidônio Palmeira para avaliar os efeitos políticos das medidas que formariam a espinha dorsal do ajuste fiscal, como a limitação ao aumento do salário mínimo e o aperto de certos benefícios sociais.

A avaliação de que o plano poderia ter efeitos desastrosos sobre a avaliação do governo fez com que Lula determinasse que o anúncio fosse compensado com a antecipação da reforma do Imposto de Renda. Quando o presidente consultou ministros que integram o núcleo de seu governo, Fernando Haddad foi o único a votar contra a proposta.

O projeto que amplia a faixa de isenção do IR foi entregue ao presidente pelo ministro da Fazenda há cerca de três meses, com o nome de Brasil Justo. Haddad queria que ele fosse lançado de forma separada. Após a ordem de Lula, no entanto, o plano foi incorporado ao ajuste fiscal, e o pacote recebeu um slogan único: governo eficiente, país justo.

Haddad perdeu em duas pontas. De um lado, a contenção de danos acabou ofuscando o plano de contenção de gastos que, mesmo descontada a má vontade crônica de investidores, poderia ser vendido como um compromisso concreto de Lula. O anúncio conjunto torna bem mais custoso o esforço do ministro para reduzir as muitas incertezas sobre o controle da dívida pública.

Além disso, Haddad foi obrigado a usar como amortecedor um benefício que deveria servir como trampolim. A isenção do Imposto de Renda é uma aposta eleitoral de Lula, mas vem ao mundo no contexto amargo de um aperto de contas e, sem garantia de aprovação até o fim de 2024, pode levar mais de um ano para chegar ao bolso do brasileiro.


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