Em carta aberta ao Ministério da Fazenda, divulgada na tarde desta sexta-feira (10), o presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, atribuiu principalmente à depreciação cambial e à desancoragem das expectativas do mercado o “estouro” da meta de inflação em 2024. A carta de explicação à Fazenda é um procedimento de praxe toda vez que a meta é ultrapassada. Há menos de um mês no cargo, a tarefa coube a Galípolo.
Essa foi a segunda vez que a meta foi descumprida no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em 2023, a inflação chegou a 4,62%. Os números de 2024, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, mostram a alta de preços no patamar de 4,83%. A meta estipulada pelo Conselho Momnetário Nacional é de 3%, com um intervalo de 1,5% para mais ou menos. Ou seja, o teto, de 4,5% foi ultrapassado em 0,33 ponto percentual.
Os principais responsáveis pelo aumento do IPCA de 2024 foram a alta dos preços de alimentos, especialmente de carnes e café torrado e moído. Também colaboraram custos com Saúde e Cuidados pessoais e dos gastos com Transportes. Os três grupos do IPCA responderam por cerca de 65% do resultado.
“A inflação em 2024 ficou acima do intervalo de tolerância em decorrência do ritmo forte de crescimento da atividade econômica, da depreciação cambial e de fatores climáticos, em contexto de expectativas de inflação desancoradas e inércia da inflação do ano anterior”, diz a carta da Autoridade Monetária.
Depreciação cambial é destacada na carta de Galípolo
O documento deu destaque à depreciação cambial. “A significativa depreciação cambial decorreu principalmente de fatores domésticos, complementada pela apreciação global do dólar norte-americano. A taxa de câmbio subiu de R$4,95/US$ na média do último trimestre de 2023 para R$5,84/US$ na média do mesmo período em 2024, uma variação de 18,0%”, diz a carta, que também considera as reações internas.
“No âmbito doméstico, a percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio. Os termos de troca não desempenharam papel relevante, pois, depois de terem piorado por alguns meses em 2024, logo se recuperaram, situando-se no segundo semestre do ano em níveis semelhantes aos do mesmo período de 2023.”
Outro fator apontado como inflacionário foi o crescimento da atividade econômica. O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 3,3% no acumulado do ano até o terceiro trimestre de 2024. O BC espera crescimento de 3,5% para 2024. O crescimento do consumo refletiu o aumento da massa salarial real.
“Esse dinamismo se refletiu na estimativa do hiato do produto, que, depois de se situar ao redor de valores relativamente neutros em 2023 (média de 0,1%), passou para uma média de 0,6% em 2024 (0,7% no último trimestre do ano). Esse desempenho da atividade econômica foi bem acima das expectativas do BC e dos analistas”, destaca o documento.
Selic deve continuar a subir
Galipolo também sinalizou a continuidade da política monetária restritiva para alcançar a convergência inflacionária. Atualmente, a Selic (taxa básica de juros) está em 12,25% ao ano, e o BC já contratou duas novas altas de 1 ponto percentual para janeiro e março. Analistas do mercado financeiro já preveem o patamar dos 15% em junho.
“Diante de um cenário mais adverso para a convergência da inflação, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões. A magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.”