Forró: a noite de uma solteira solta no salão


Sábado agora eu e uma amiga fomos a um forró. Quem me conhece sabe: não tem nada que eu goste mais do que um remelexo. Estava exausta por ter dormido tarde na noite anterior (amigo secreto do trabalho) e um tanto desanimada, mas ela insistiu, sabendo que a palavra “forró” ia tocar meu coração. Depois do fim do último namoro, estou solteira, o que facilita bastante esse tipo de programa. O lugar, que eu ainda não conhecia, ficava em uma ruazinha lotada de botecos e gente bebendo do lado de fora, o que me pareceu agito demais pro meu estado de espírito.

Entramos em um galpão com música alta e um bando de casais rodopiando na pista. Estava fresquinho do lado de fora e eu estava enrolada numa pashmina (uma espécie de xale com nome indiano). Estacionei meu corpo num canto do salão, já arrependida de ter topado sair de casa naquela noite. Disse para minha amiga: “Você tem direito a 3 danças. Depois disso, vamos nessa.”. Um tempo depois tirei o xale, porque comecei a sentir calor; enrolei-o de qualquer jeito e soquei dentro da minha bolsa, daquelas com a alça cruzada no corpo. Eu fazia movimentos mínimos pra lá e pra cá, na tentativa de me manter desperta.

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Para a sorte da minha amiga, ao fim da última bailada que ela tinha direito, um rapaz me chamou pra dançar. Ele usava uma camisa listrada, era um pouco mais alto do que eu e tinha um perfume agradável. Altura compatível e um bom perfume, no forró, é ouro. Pensei: “Que se dane, só essa.” Dancei de bolsa e tudo, que girou mais do que eu e que, para meu constrangimento, bateu algumas vezes no meu par. Ao final da música, demos um abraço e agradecemos pela dança, como manda a etiqueta forrózense. Cada um pro lado, mas ficou um trisquinho de vontade de dançar com ele de novo. Na verdade, de só dançar com ele, porque já tinha sido testado e aprovado, e eu não estava com vontade de novas experiências naquela noite.

Resignada, deixei minha bolsa na chapelaria e dei uma circulada com a minha amiga. Um homem de coque, que ela classificou como “pai de pet”, a chamou para dançar pela segunda vez. Ela estava com uma Heineken na mão, então agradeceu e recusou o convite. Pensei de novo, “que se dane”, e disse: “Eu danço com você.”. Segundo ela, o cara “sensualizava”. Isso significa que ele tinha um estilo de dançar “meio Wando”.

Dali a um tempinho, apareceu o tal moço que havia me tirado do cantinho do castigo. Dançamos de novo e, depois, nos apresentamos. Comentei que ele tinha o nome do meu irmão. Na volta pra casa, minha amiga me lembrou que também era o nome do meu ex-namorado. Não foi por mal, mas eu dispensaria fácil essa lembrança. Eu e o dançarino engatamos num papo. Apesar de falarmos um no ouvido do outro, confesso que, de cada 5 palavras, entendi 3.

Ossos de se conversar no forró. O que eu captei foi que ele já havia tido crises de ansiedade o que, pra mim, é uma boa credencial. Falamos de Rivotril e meditação, biodinâmica e terapia biomagnética, seja lá o que isso for. Dançando, nos encaminhamos para a borda da pista, fora da luz discreta do salão. Lá pelas tantas, soltamos as mãos e enlaçamos os braços um no corpo do outro, enquanto nos movimentávamos lentamente. Tipo bailinho da 4ª série. As cabeças coladas foram escorregando até deixarem bochecha com bochecha.

Nesse momento, entrava no palco a banda Caprichoso, o destaque da noite. O vocalista era o Aloísio, do antigo Trio Sabiá. Quem dançou nos anos 2000 sabe que isso é uma grande coisa. O cara disse no meu ouvido: “Se gostar da próxima música você me dá um beijo?”. Eu disse: “Sim, mas só se eu gostar.”. Aloísio nem tinha aberto a boca e minha boca já estava na do rapaz.

O fato é que, pra quem chegou enrolada na manta da vovó, eu estava aproveitando bem aquele forró. Certa hora, tive que pedir licença pro mocinho. O problema é que, como eu já tenho uma certa idade, estava tonta como uma barata no salão. Da última vez que fui ao forró, passei o vexame de parar uma dança e ir à farmácia comprar um remédio pra labirintite. Mas daquela vez eu estava prevenida. Fui à chapelaria, saquei um antiemético da bolsa (remédio para enjoo que acalma o labirinto) e rodopiei mais um bom tanto nos braços do rapaz.

Em determinado momento, minha parceira de forró passou por mim e disse: “Quero ir embora.”. Eu: “Mais já?”. Eram 3h da manhã. Eu tinha chegado às 23h de mau humor e estava achando 3h cedo. Pedi 10 minutinhos pra ela, com carinha de “mãe de pet”, e fui me despedir do forrozeiro com uma última dança, essa sensualizada de propósito. Trocamos telefone, como pessoas com 40+. Se a amiga deixasse, eu tinha varrido aquela pista depois do Aloísio ter ido dormir.

No carro, apesar de ela ter me lembrado do bandido do meu ex-namorado, meu coração estava pleno. Antes de fechar os olhos falei pra mim mesma: “Amanhã vou estar ferrada”. Então pensei pela terceira vez: “que se dane”. Se tiver coisa melhor que um forrozinho, ainda mais com beijinho de olhos fechados, eu não conheço.



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