Em Diadema, a autocrítica não é um tabu para o PT. “Eu não consegui fazer um governo como eu gostaria”, diz José de Filippi Júnior (PT), sentado no sofá de sua casa, no centro da cidade.
O ex-tesoureiro do presidente Lula, na campanha de 2006, e de Dilma Rousseff, quatro anos depois, tenta agora se reeleger à prefeitura do município, na região do ABC paulista. Desde os anos 1990, o político já ocupou três vezes o cargo.
No segundo turno, Filippi enfrenta o candidato Taka Yamauchi (MDB), que tentou se eleger deputado federal há quatro anos. Num primeiro momento, Yamauchi concordou em conceder entrevista à Folha, mas, na véspera, desmarcou o encontro com a reportagem.
No primeiro turno, o emedebista saiu na frente, somando 45% contra 43% do prefeito, num cenário de acirramento na disputa municipal.
Filippi cita três motivos principais para não ter atingido as metas esperadas. Ele diz, em primeiro lugar, que seu antecessor, Lauro Michels (PV), deixou a prefeitura desestruturada e com dívidas. Afirma ainda que a pandemia prejudicou sua gestão e que o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) diminuiu os recursos destinados à sua administração.
O prefeito também atribui a sua dificuldade na campanha ao contexto nacional, que indica uma resistência da população a legendas de esquerda. No primeiro turno, o PT teve derrotas no próprio ABC paulista, reduto histórico do partido, conhecido pelas greves sindicalistas no fim da ditadura militar —e também pelo apelido de “cinturão vermelho”.
Em São Bernardo do Campo, onde Lula vota, Luiz Fernando (PT) amargou o terceiro lugar no primeiro turno. Em contraste, o PL conquistou 510 municípios e se tornou a quinta maior força eleitoral do país.
“O projeto do presidente Lula precisa ter um olhar mais apurado e procurar entender melhor o que aconteceu”, afirma Filippi, que é fundador do PT. “Acho que agora o eleitor quis dar um sinal para mim.”
Tentando dialogar com um eleitorado mais amplo, ele escolheu o pastor evangélico Rubens Cavalcanti (PV) para compor a chapa como vice. “Alguns setores evangélicos têm preconceito contra o PT que é injustificado. Você fala em PT para algumas dessas pessoas e parece que você está falando do demônio.”
Em 2016, Filippi entrou na mira da Lava Jato e foi acusado de ter embolsado R$ 2,4 milhões, desviados da Petrobras, o que ele nega. Na época, foi levado pela Polícia Federal, numa condução coercitiva, para prestar seu depoimento. O então juiz Sergio Moro, no entanto, negou um pedido de prisão preventiva contra o petista, alegando falta de provas.
Nestas eleições, Filippi é aturdido por dois desafios locais: a necessidade de melhorar o sistema de saúde e o desastre causado pelo temporal deste mês.
As ruas de Diadema estavam desertas na sexta-feira (18). Descendo a rua da casa do prefeito, só se encontrava a ambulante Marly Hopf, 65, sozinha na praça da Igreja da Matriz. “Isso aqui virou um filme de terror na semana passada”, lembra ela.
Com a previsão de novas chuvas, a população preferiu se recolher, temendo um novo apagão e mais queda de árvores. O temporal que atingiu a região metropolitana de São Paulo deixou um morto em Diadema.
Hopf conta que o vendaval levou o telhado da igreja foi pelos ares, enquanto a fiação elétrica rebentava no asfalto, formando uma “bola de fogo”. Filippi culpa o estado por não ter avisado a prefeitura sobre o temporal.
A vendedora diz ter dificuldades com o serviço de saúde de Diadema. Tratando as sequelas de uma cirurgia no cérebro, afirma não encontrar médicos. “Tudo você precisa ir a São Bernardo. Se você morre, você também vai parar lá.”
Não à toa, a criação de um novo hospital na cidade está no centro do debate entre os candidatos. Yamauchi, que se candidatara à Prefeitura de Diadema em 2020, pensa que seu adversário criou um fato político insustentável ao fazer a promessa sem ter apresentado um projeto para tanto.
Filippi conta ter o apoio de Lula para a construção do edifício e diz já ter apresentado um pré-projeto ao Ministério da Saúde e aprovado um orçamento.
Nas redes, seu opositor, ex-secretário de Obras de Ribeirão Pires (SP), ostenta o apoio do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), replicando a divisão entre direita e esquerda presente na capital paulista. “A gente sabe que o senhor [Filippi] não fez nada pela cidade”, afirmou Yamauchi em debate promovido pelo portal G1.
“Como prefeito, o senhor preferiu usar um hospital particular, porque tem medo de morrer.” Em seu plano de governo, Yamauchi aposta na tecnologia em diferentes áreas de uma possível gestão. Na saúde, propõe a criação do aplicativo Saúde na Palma da Mão e uma Central Unificada de Atendimento para modernizar e otimizar o setor.
Também sugere a elaboração do programa Saúde Sem Espera, em que o cidadão de Diadema teria o primeiro atendimento em até 59 minutos. Para a área da defesa civil, o plano é vago: cita apenas a proposta de “combater os alagamentos e inundações”.
Entre 2023 e 2024, Yamauchi foi presidente da SPObras na administração do prefeito Ricardo Nunes (MDB). Como mostrou a Folha, o orçamento da empresa municipal foi inflado por Nunes e se tornou uma vitrine para a sua pré-campanha —e para a de Yamauchi também.
A SPObras teve uma proliferação de obras com dispensa de licitação nesse período. Além disso, metade dos contratos firmados em 2023 envolve empresas controladas por um único grupo familiar. Algumas delas tinham sede em endereços residenciais. Nunes sempre negou irregularidades.
A questão não entrou na pauta do debate na cidade. “Quero colocar uma reflexão. São 16 anos de uma gestão falida, incompetente, que não entregou nada. Por isso quero uma oportunidade, através da fé e da esperança”, afirmou Yamauchi no encontro.