Disque 100 registra 3.426 acusações de racismo em 2024


Casos registrados pela plataforma do governo triplicaram desde 2020; os processos de racismo pendentes de julgamento são 11.721

O Brasil registrou 3.426 acusações de racismo até 4 de novembro de 2024. Os números são 3 vezes maiores que os registrados em 2020, quando o país teve 1.149 relatos de violência racial, e já ultrapassam os registros de todo o ano de 2023. 

A curva histórica do gráfico abaixo mostra que, segundo os dados do Disque 100, plataforma oficial do MDH (Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania) destinada a receber demandas de violações de Direitos Humanos, o registro de violações de direitos relacionados à raça estão em ascensão.

O cientista político e advogado, Nauê Bernardo, diz que os dados do infográfico acima não representam um aumento no número de casos, mas uma alta nas acusações. Segundo Nauê, isso se dá por uma percepção maior por parte da sociedade sobre as pautas raciais e, com isso, a intolerância ao crime de racismo cresceu.

O Disque 100 está disponível diariamente para atender as demandas de violações, 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. As acusações podem ser feitas por qualquer pessoa, são registradas e encaminhadas aos órgãos competentes. Além disso, também é possível fazer reclamações, sugestões ou elogios sobre o funcionamento dos serviços de atendimento.

O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania recebe, analisa e encaminha aos órgãos de proteção e responsabilização as denúncias de violações, especialmente as que atingem populações em situação de vulnerabilidade social. Apesar disso, as acusações registradas nessa plataforma não necessariamente resultam em processo criminal no Judiciário.

PROCESSOS POR CRIME DE RACISMO

No Judiciário, os números são ainda maiores. Só em 2024, até 30 de setembro, foram abertos 5.873 novos processos com acusações de violência racial. Os dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) indicam que até o final do ano esse número ainda deve crescer. 

Considerando-se o acumulado dos anos anteriores, de 2020 a 2023, assim como o número de acusações via Disque 100, a quantidade de processos abertos formalmente no Judiciário também está em ascensão.

Em 2024, a Justiça brasileira já julgou pelo menos 4.875 casos de racismo. Porém, há ainda 11.721 processos por crimes de racismo que aguardam uma decisão dos tribunais. É o maior contingente já registrado de casos dessa natureza em espera por uma conclusão. 

O tempo para o andamento dessas ações pode sofrer a influência de variados fatores e deve considerar, por exemplo, o período pandêmico, que atrasou o trabalho não só do Judiciário, mas de inúmeros setores. Apesar disso, Nauê avalia o tempo para o julgamento desses casos no país como “irrazoável”:

“O tempo de julgamento nos casos de racismo no Brasil reflete o Judiciário como um todo, com um período de tempo irrazoável para os julgamentos. É claro que isso tem a ver diretamente com a enxurrada de processos que chegam ao Poder Judiciário, mas é fato que, se crimes tão graves estão demorando tanto para serem julgados, é necessário que se reveja como se dá essa sistemática”.

O advogado afirma que a demora no julgamento dos processos, que podem acabar perdendo o tempo legal de análise, aumentam a sensação de impunidade. Explica ainda que geralmente os processos não encerram com a prisão dos acusados e que o principal mecanismo de reparação às vítimas é a indenização. Isso porque “a prisão não causa um sentimento de reparação propriamente dita”. 

A solução para esse cenário, segundo o cientista político, exige o entendimento de todos os envolvidos no cotidiano do Judiciário de que o racismo “é um problema sistêmico dentro do Brasil”. Para tanto, “é preciso que se treine o Poder Judiciário, treine os magistrados, magistradas, assessores e analistas para que possam dar o devido tratamento para esses casos. Isso passa pela racionalização de todo o sistema e depende inclusive de mais nomeações”.

PODERDATA: BRASIL É RACISTA PARA 75%

A maioria dos brasileiros (75%) diz haver racismo no Brasil. Mas apenas 33% admitem que têm preconceito contra negros, segundo pesquisa PoderData realizada de 12 a 14 de outubro de 2024. 

A pesquisa fez 2 perguntas. Primeiro, se o entrevistado achava que havia preconceito contra negros. Depois, se o próprio entrevistado se considerava racista. Há uma assimetria nas respostas, como mostra o infográfico a seguir:

NEGROS FORAM 87% DOS MORTOS POR POLICIAIS EM 2023

Um estudo publicado (PDF – 628 kB) em novembro de 2024, pela Rede de Observatórios da Segurança mostra que 4.025 pessoas foram mortas por policiais no Brasil em 2023. Em 3.169 desses casos foram disponibilizados os dados de cor da pele: 2.782 das vítimas eram pessoas negras, o que representa 87,8% das vítimas.


Essa reportagem foi produzida pelos estagiários Evanir Júnior e Maicon Viana sob a supervisão do editor Jonathan Karter.





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