Diretor de escola do RS é afastado após ler em rádio texto plagiado apontado como racista


O diretor de uma escola foi afastado para responder a um processo disciplinar por ter se referido aos estados do Nordeste como “o Brasil da senzala”

Caue Fonseca

Porto Alegre, RS

O diretor de uma escola de Jacutinga (RS), município de 3,5 mil habitantes a cerca de 400 quilômetros de Porto Alegre, foi afastado para responder a um processo disciplinar por ter se referido aos estados do Nordeste como “o Brasil da senzala” em um comentário de rádio.

A fala de Flávio Luiz Gabardo, porém, plagiava um texto que não era de sua autoria, mas sim do jornalista J.R. Guzzo, e havia sido publicado três dias antes na Revista Oeste. Procurada, a publicação não se manifestou.

Gabardo é diretor da Escola Estadual Erico Verissimo há mais de 20 anos e tinha um espaço de opinião na rádio Campinas do Sul da cidade de mesmo nome, vizinha a Jacutinga.

Conforme o diretor, o comentário ia ao ar às segundas e quintas-feiras e era gravado e enviado por ele a rádio por áudio de WhatsApp fora de horário de expediente.

Em 6 de outubro de 2022, em meio a uma fala de mais de 10 minutos sobre o resultado das eleições em primeiro turno, Gabardo leu um longo trecho do artigo de Guzzo intitulado “À sombra da corrupção sem limites”. Em determinado momento, o texto diz “o Brasil do progresso, entre Mato Grosso e Rio Grande do Sul, incluindo São Paulo e Rio de Janeiro, preferiu Bolsonaro. O Brasil da senzala, entre a Bahia e o Maranhão, ficou com Lula.”


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A comparação fez com que o PT de Jacutinga divulgasse uma nota de repúdio dizendo que “o comentarista [Gabardo] atacou os/as eleitores/as que vivem no Nordeste do país de forma racista e mesquinha”. O partido, àquele momento, não sabia que o comentário se tratava de um plágio.

Conforme a vereadora Sandra Mari Soares (PT), uma das pessoas que assina a nota, o fato foi comunicado à Federação Brasil da Esperança (composta por PT, PV e PCdoB), que representou contra Gabardo junto à Secretaria Estadual de Educação do RS, que abriu uma sindicância, e à Polícia Civil.

À reportagem, Gabardo disse que ler o texto de Guzzo no ar não significa que ele compartilhe das mesmas opiniões do autor, que “jamais utilizaria” a expressão “senzala” para se referir aos estados do Nordeste.

“É como se alguém processasse os leitores do jornal por um texto que o jornalista escreveu”, diz Gabardo.


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Entrevistado em uma live da Revista Oeste na segunda-feira (20), Gabardo também argumentou que tinha a liberdade para ler um texto de outrem no ar. O diretor, porém, em momento algum do comentário disse aos ouvintes que lia um texto que não era de sua autoria.

Questionado sobre ter ocultado a autoria do texto pela reportagem, Gabardo disse que só revelou que se tratava de um texto de Guzzo quando foi instaurada a sindicância sobre o teor do comentário. Mas que, para ele, estava suficientemente claro aos ouvintes da rádio que o texto era uma leitura de outro autor.

A íntegra do comentário está publicada em vídeo no Facebook da rádio Campinas do Sul, entre os minutos 1:05:00 e 1:15:00. O artigo de Guzzo está na publicado no site da revista Oeste.
Após a repercussão, Gabardo deixou de fazer comentários na rádio.

Em 28 de dezembro, foi instaurado um PAD (Processo Administrativo-Disciplinar) para avaliar a conduta de Gabardo. O diretor disse que no início de janeiro ele e sua vice-diretora foram chamados a Erechim (RS), onde fica a 15ª CRE (Coordenadoria Regional da Educação) responsável por Jacutinga (RS), e comunicado que ele seria afastado do trabalho até o resultado do processo.


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Se dizendo abalado com o episódio, que veio após outros problemas pessoais, Gabardo diz ter pedido uma licença-saúde, que segue em vigor.

Seu afastamento (com os vencimentos mantidos) só foi oficializado no Diário Oficial do Estado em 1º de março. O documento de instauração do PAD avaliará se o servidor violou o estatuto do servidor público, a Lei 7.716, que define crimes de preconceito de raça, e uma resolução do TSE referente ao Código Eleitoral.

A vereadora Sandra aponta ainda que Gabardo teria comparecido à escola em 6 de fevereiro, dia em que se iniciaria o ano letivo, e caluniado políticos do PT junto à comunidade escolar com adjetivos como “encostados” e “bando de desocupados”, o que levou o partido a procurar novamente a 15ª CRE. Os petistas souberam, então, que o diretor estava em licença e que não poderia estar na escola.


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Gabardo disse que foi convidado pelo conselho escolar a comparecer nessa data e dar esclarecimentos sobre o que estava se passando, mas que deixou a escola em cerca de meia hora, assim que se encerrou a reunião do conselho. Ele alega estar sendo perseguido politicamente e busca o apoio da comunidade. Um abaixo-assinado circula pela cidade e um protesto foi realizado em frente à escola no final de semana.


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Procurada pela reportagem para saber o motivo do afastamento de Gabardo em 1º de março, dois meses após a instauração do PAD, a Secretaria Estadual de Educação encaminhou a solicitação à PGE (Procuradoria-Geral do Estado). A PGE, todavia, disse que não pode dar detalhes do andamento do processo até a sua conclusão.



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