Brasil tem ‘década perdida’ em emissões de carbono


O quadro é ainda pior nas emissões líquidas, quando são descontados os gases removidos por florestas, que tiveram alta de 56%

Jéssica Maes

O Brasil perdeu uma década na apertada corrida contra as mudanças climáticas. Entre 2010 e 2021, as emissões brutas de de gases de efeito estufa do país foram de 1,7 bilhão de toneladas para 2,4 bilhões –um aumento de 40,7%.

O quadro é ainda pior nas emissões líquidas, quando são descontados os gases removidos por florestas, que tiveram alta de 56% (de 1,3 bilhão para 1,7 bilhão de toneladas).

Os dados são do Seeg (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa) do Observatório do Clima. O compilado dos últimos dez anos foi divulgado nesta quinta-feira (23).

O principal responsável pelos números é o desmatamento, que, em 2021, respondia por cerca de 49% das emissões nacionais. Naquele ano, as emissões brutas por uso da terra e florestas (setor que compreende principalmente o desmate) em todos os biomas atingiram 1,19 bilhão de toneladas (Gt) de gás carbônico equivalente (CO2e, unidade que representa os gases de efeito estufa), aumento de 83% em relação a 2010.

No mesmo período, segundo dados do sistema Prodes, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a taxa de destruição anual da Amazônia cresceu 86%, indo de 7.000 km² para mais de 13 mil km².

O ano de 2010 é especialmente importante porque marca a regulamentação da PNMC (Política Nacional sobre Mudança do Clima), que foi criada para garantir a adoção de medidas para prever, evitar ou minimizar as causas das mudanças climáticas. Esta lei previa que o desmatamento no bioma deveria ter sido de no máximo de 3.925 km² em 2020 –o índice real foi de 10,8 mil km².


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Já 2021 deveria ter sido o primeiro ano de implementação da meta brasileira para cumprir o Acordo de Paris (a chamada Contribuição Nacionalmente Determinada, conhecida pela sigla em inglês NDC).

De acordo com o relatório do Seeg, com a PNMC, o que se esperava para 2021 é que as emissões nacionais tivessem entrado numa trajetória de redução, que o país adotasse novas metas, mais ambiciosas, e que a suposta redução nas taxas de desmate da Amazônia deixasse o Brasil numa posição vantajosa para cumprir a meta original da NDC, de reduzir as emissões em toda a economia em 37% até 2025 em relação aos níveis de 2005. “O que se verificou, porém, foi algo muito diferente”, diz o documento.

“Desde a primeira edição do Seeg, em 2012, até a atual, em 2021, o aumento verificado nas emissões brutas foi de 30% e, nas líquidas, de 40%. Esses números indicam que, embora a PNMC tenha produzido inovações importantes no ordenamento legal brasileiro e criado instrumentos para mensuração de emissões e combate à mudança do clima, do ponto de vista da atmosfera a década de 2010 foi perdida para o Brasil.”

Quanto à meta original da NDC brasileira, entre 2005 e 2021, a redução nas emissões brutas foi de apenas 8,2% e nas líquidas, de 20%, segundo os dados do Seeg.


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Durante o governo de Jair Bolsonaro, a NDC foi atualizada duas vezes, ambas recorrendo a mudanças do referencial de emissões no ano-base de 2005. Na prática, a manobra, que foi chamada de “pedalada climática”, faria o Brasil chegar a 2030 com uma meta de emissão maior do que o previsto pela primeira NDC.

As emissões de todos os outros setores também cresceram entre 2010 e 2021. Em resíduos, principalmente lixo e esgoto, a alta foi de 31%, em processos industriais e uso de produtos, houve aumento de 13%, em energia, o crescimento foi de 17%, e, em agropecuária, de 12%.

No setor de energia, a alta pode ser explicada pelo aumento no número de usinas termelétricas fósseis e do uso do diesel nos transportes. Na agropecuária, cresceram o rebanho bovino e consumo de fertilizantes.

O Brasil é o sétimo maior emissor de gases de efeito estufa, respondendo por 3% do total mundial, de acordo com informações da ONG WRI (World Resources Institute), que vão até 2019. O país fica atrás de China (25,2%), Estados Unidos (12%), Índia (7%), União Europeia (6,6%), Rússia (4,1%) e Indonésia (4%).


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“[No entanto, desde 2019], o desmatamento caiu na Indonésia, enquanto no Brasil ele subiu. Portanto, é provável que o país seja na realidade o sexto maior emissor”, ressalta o relatório.

De acordo com o mais recente relatório o painel científico do clima da ONU (IPCC, na sigla em inglês), lançado na última segunda-feira (20), as emissões globais devem ser cortadas em pelo menos 48% até 2030 para que o mundo contenha o aquecimento global em até 1,5ºC, cumprindo o Acordo de Paris.


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