Orientações para garantir aos produtores rurais brasileiros meios de comprovar a qualidade e a sustentabilidade de suas mercadorias exportadas foram reunidas em um documento com diretrizes para o mercado europeu.
O material é voltado à lei antidesmatamento da União Europeia (UE), que teve a implementação adiada para dezembro de 2025.
As diretrizes para conformidade ambiental dos produtos brasileiros foram lançadas na última quinta-feira (28).
O documento foi elaborado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e pela Associação Brasileira de Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa).
Na ocasião, o material foi entregue ao conselheiro do Clima da Delegação da União Europeia no Brasil, Laurent Javaudin.
Leia a íntegra do documento:
O objetivo é fortalecer a segurança jurídica nas relações comerciais entre Brasil e o bloco europeu, com foco nas cadeias produtivas da madeira e do gado bovino.
O documento também se volta aos compradores internacionais dos produtos agropecuários brasileiros ao detalhar os mecanismos confiáveis de verificação da regularidade ambiental no Brasil.
Alvo de críticas do governo brasileiro, a regulamentação da UE vai proibir a importação de produtos ligados a áreas que tenham sido desmatadas desde 2020. Também exigirá que a produção agrícola esteja adequada à legislação nacional do país de origem.
A regra entraria em vigor já em dezembro, mas teve a implementação adiada para o ano que vem. Mesmo assim, o governo brasileiro manterá a pressão diplomática sobre a União Europeia para que a lei antidesmatamento não seja implementada.
A norma antidesmatamento é um outro foco de embate do agronegócio do Brasil com a UE, numa relação que foi marcada na última semana pelo incidente envolvendo o Carrefour.
O CEO da varejista na França, Alexandre Bompard, afirmou que a rede deixaria de comercializar carnes oriundas do Mercosul. Com ampla repercussão econômica e diplomática, ele se desculpou pela fala.
Diretrizes
Segundo o CNMP e a Abrampa, as diretrizes para adequação à regra europeia oferecem um “caminho seguro” para o produtor demonstrar sua regularidade perante o mercado internacional.
“O documento atua como uma ponte entre o produtor rural brasileiro comprometido com a legalidade e os mercados internacionais cada vez mais exigentes em termos de conformidade ambiental, especialmente o europeu, consolidando uma via de comércio internacional baseada na segurança jurídica e na sustentabilidade”, dizem aos órgãos.
As diretrizes trazem os mecanismos que podem ser usados para garantir a comprovação da regularidade ambiental e atender as regras do regulamento europeu.
À CNN, o presidente da Abrampa e promotor de Justiça no Paraná (MP-PR), Alexandre Gaio, disse que o adiamento da aplicação da lei europeia “prejudica o agronegócio que segue práticas sustentáveis”.
“A prorrogação da norma pode comprometer os esforços globais de combate ao desmatamento e às crises de biodiversidade e climática”, afirmou.
O documento reforça que o Brasil já tem os instrumentos necessários para atestar a legalidade dos produtos exportados, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), o licenciamento ambiental e as autorizações relacionadas à supressão de vegetação.
Desafios
O CAR é um registro público obrigatório para todos os imóveis rurais do país. Conforme especialistas, o cadastro é suscetível a inconsistências nos dados por se tratar de informação autodeclaratória pelo proprietário, que requer validação posterior.
Há casos, por exemplo, de sobreposição do CAR com terras indígenas e unidades de conservação.
As diretrizes do CNMP e da Abrampa destacam desafios para dar efetividade aos controles da regularidade ambiental.
Segundo os órgãos, há diversos casos “de grande preocupação” nos quais grileiros tentam fazer uso do instrumento para o reconhecimento da propriedade, “avançando ilegalmente sobre áreas de floresta protegida”.
Por isso, alertam as diretrizes, não basta cadastrar a propriedade no CAR. É preciso que o respectivo órgão ambiental tenha validado as informações do imóvel.
“Caso contrário, será necessária a adoção de medidas adicionais de devida diligência, incluindo-se a confirmação da inexistência de sobreposição territorial com Terras Indígenas e Quilombolas, Unidades de Conservação, Glebas Públicas e Florestas Públicas Não Destinadas e a adequada preservação das Áreas de Preservação Permanente e da Reserva Legal”.
Segundo Alexandre Gaio, é preciso tomar medidas para tornar o CAR um instrumento efetivo.
“Uma das questões diz respeito, justamente, à necessidade de suspensão de cadastros sobrepostos a terras públicas e indígenas, além da necessidade de aprimoramento do próprio sistema, para que esse tipo de cadastro sobreposto nem sequer possa ser finalizado”, afirmou.
“Outra preocupação nossa é a necessidade de dar publicidade aos dados do CAR, que tem sido impedida com base em uma interpretação equivocada da legislação vigente”.