A tentadora ilusão de que teremos paz no Oriente Médio


Assim como qualquer compra e venda, qualquer contrato de sociedade entre dois indivíduos comuns da população civil, acordos complexos com dezenas de ramificações também seguem a mesma lógica na geopolítica, apenas se tornam realidade se são vantajosos para ambas as partes. Jamais um proprietário de uma casa, aceitaria passar sua escritura a uma pessoa que não pagasse a soma justa e requerida de dinheiro, da mesma maneira Netanyahu e os terroristas do Hezbollah não aceitariam um acordo que não os beneficiasse circunstancialmente na guerra atual. 

Os israelenses lutam em 7 frentes de batalha diferentes nos últimos 14 meses, a exaustão física e psicológica do exército e da população de Israel, faz com que até mesmo as alas mais conservadoras da sociedade repensem a real necessidade de um conflito tão longo. Politicamente, desde o atentado do 07 de outubro de 2023, a capacidade de Benjamin Netanyahu proteger seu próprio povo foi colocada em dúvida, seus índices de aprovação caíram drasticamente e a oposição, desde a centro-direita até a esquerda mais radical, já pensa no futuro quadro eleitoral do país sem o atual premiê.

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Na política externa a guerra que começou de maneira legítima, seguindo o preceito básico da defesa de suas fronteiras e sua soberania por parte de Israel, se transformou no maior imbróglio das relações exteriores israelenses em quase 3 décadas, após a resposta desproporcional das IDF. A perda constante de apoio, até mesmo de fiéis aliados no passado, além da paralisação de negociações de paz com inimigos antigos, fizeram com que anos de uma boa diplomacia exercida pelo Estado de Israel, fossem por água abaixo em alguns meses. Somado a tudo isso, temos o maior drama de todos, as milhares de perdas humanas em ambos os lados, onde famílias inteiras foram dilaceradas por atos de terrorismo, sequestros, bombardeios e a perda completa de toda uma vida construída.

Os terroristas xiitas do Hezbollah viram o seu maior enfraquecimento acontecer no tempo recorde de 1 mês, 3 semanas e 4 dias. A maior proxy iraniana, com um exército paramilitar de dezenas de milhares de homens, teve a perda de centenas, talvez milhares de seus principais terroristas, incluindo o influente líder, Hassan Nasrallah, assassinado em setembro. Sendo o “filho preferido” dentre todas as proxies do governo de Teerã, o Hezbollah esperava ter um outro desfecho para essa guerra, onde Israel enfraquecido com a guerra em Gaza, seria mais duramente atingido pelo grupo. Apesar de ainda estarem fortes em muitas posições no sul do Líbano, a destruição trazida ao país por esse conflito, fez com que o Hezbollah reconhecesse que o momento de continuar atacando Israel deveria ser substituído pela luta de sua própria sobrevivência. 

Nesse cenário a fadiga, o desgaste na mídia internacional, a falta de munições, a morte de lideranças e a forte pressão de quase todas as nações do mundo, fizeram com que um acordo, interpretado como vantajoso para ambas as partes, fosse assinado. O momento é certamente de grande alívio para milhões de libaneses e israelenses que vão poder voltar às suas casas, assim como já estão fazendo, antes das festividades cristãs, judaicas ou muçulmanas do final do ano. Todavia, há muitas pessoas extremamente esperançosas que esse positivo cessar-fogo selado signifique o promissor começo para um contínuo processo de paz em todas as frentes de batalha.

Os Estados Unidos conjuntamente com os mediadores egípcios já pressionam o Hamas para que siga um caminho similar para que também busquem uma pausa temporária da guerra com Israel. Para aqueles mais realistas, contudo, qualquer acordo além daquele feito com o Hezbollah, é altamente improvável de ser assinado em um futuro próximo. Com o ônus de uma guerra não concluída como gostaria, Netanyahu sabe que as demonstrações de fraqueza, em uma região mundialmente conhecida pela violência de suas guerras, têm seus limites, e por isso o poderoso exército de Israel, precisará dar respostas pontuais aos seus próprios cidadãos e aos seus demais inimigos, dizendo ainda seguir firme em seus objetivos. 

O avanço da diplomacia, a criação das Nações Unidas e de outras dezenas de órgãos multilaterais nos trouxeram grandes avanços na manutenção da paz em muitas ocasiões. Mesmo fazendo menos do que nossa irreal expectativa, tais organizações ajudaram grande parte das nações a atravessar a longa Guerra Fria sem que se transformasse em um conflito mundial, além de ampliar os canais de comunicação que de fato reduzem o tempo das guerras e diminuem consideravelmente o número de mortos e feridos.

Infelizmente, para algumas partes do nosso planeta, a compreensão de certos conceitos é simplesmente muito diferente. O Oriente Médio é uma das regiões mais fascinantes e complexas do mundo, mas onde o sonho de paz completa é visto como uma ilusão há mais de 3000 anos, seja para seus habitantes, seja para meros observadores. O cessar-fogo no Líbano é extremamente importante para milhões, mas lamentavelmente apenas um devaneio de calmaria, em meio as constantes tempestades no Oriente Médio



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