Sabe aquelas fotos maravilhosas que alguns trilheiros e escaladores conseguem esfregar na cara de nós, pobres mortais que postamos o que deu pra fazer nas redes sociais da vida —e olhe lá? Pois por trás de boa parte dessas imagens há seres que têm um olhar treinado para a melhor luz, o ângulo perfeito, o abismo mais profundo e, claro, um senso estético especial que faz deles verdadeiros artistas, além de cúmplices da mãe natureza.
Entre os que se destacam na tarefa de mostrar ao mundo o que poucos têm oportunidade de contemplar estão o mineiro de Belo Horizonte Henrique Murta, o paulistano Ricardo Feres e o carioca Rafael Duarte. Cada um em sua linha, eles somam um dos mais belos e variados acervos que qualquer trilheiro ou escalador pode desejar.
À pergunta óbvia de quem registra seus melhores momentos com um prosaico celular (por melhores que sejam suas câmeras), sobre o que faz a diferença na hora de captar uma imagem, Murta, que expõe suas fotos em galerias de Barcelona, onde vive atualmente, responde que é um conjunto de fatores.
“Tudo depende do objetivo da pessoa”, explica ele, “se quiser qualidade técnica muito alta, uma imagem que permita uma impressão grande, são muitos detalhes envolvidos”. Mas, basicamente, Murta recomenda estudar o lugar antes mesmo de chegar lá, como parte do planejamento logístico. “Analisar bem o sensoriamento remoto, imagens de satélite, buscar as paisagens mais interessantes e, principalmente, ter em mente que, além de dominar a técnica, você tem que saber trabalhar em condições adversas, de luz, de acesso, ter paciência de esperar o momento e a luz certos, e levar um bom equipamento leve, porque se for pesado vai comprometer a jornada”, acrescenta, falando ao blog enquanto finaliza os preparativos de um workshop que vai levar fotógrafos amadores e profissionais para a Ilha da Madeira.
Paciência e dedicação, efetivamente, são características presentes no currículo de bons fotógrafos de natureza. Gente como o Rafael Duarte, que já encarou os perrengues do Everest ao lado de Roman Romancini, e dos quais nasceu o livro “Além dos Sonhos – da Cama ao Cume”. Embora experiente em trilhas e escaladas por todo o planeta, seu olhar treinado convive atualmente com uma grande paixão ali no quintal de sua casa: o Rio de Janeiro. Com dois livros já lançados com a temática carioca, Duarte está lançando o “Pão de Açúcar —monumento natural”.
“É parte de um grande legado que pretendo deixar sobre os patrimônios naturais da minha cidade”, conta Duarte, que além de “RIO” e “Trilha Transcarioca —guia de bolso”, já realizou dois documentários sobre a capital fluminense. “Espero que meu trabalho contribua para a conservação dos ambientes naturais do Rio e estimule a ampliação de áreas protegidas”, acrescenta.
Para ele, a fotografia de viagem e natureza nasceu do gosto por registrar lugares “onde procurava viver imersões naturais e sociais”. Hoje ativista da causa ambiental, criou uma equipe que promove expedições jornalísticas e fotográficas em ambiente naturais, a Miramundos.
“O diferencial de uma boa foto é que seja uma imagem que conte uma história ou que faça parte de um contexto maior que transmita uma mensagem que transcenda o significado mais primário, que vai além do instante”, define Duarte. “Deve ser algo que instigue o espectador a pensar e refletir sobre o tema proposto. Não apenas pelo prazer imediatista de se ver uma foto esteticamente bonita, afinal, a beleza também pode morar na poesia das entrelinhas”, completa.
Ricardo Feres, autor do livro “As Mais Belas Trilhas da Patagônia” também insiste no tópico dedicação como chave para se obter uma bela imagem. “Pessoas que são naturalmente sensíveis e criativas fazem fotos artísticas com maior facilidade que as pessoas que não têm essas características, mas a definição do que é arte e do que é comum é recorrente na fotografia e, acredito, nunca haverá um consenso”, explica.
“A arte deve transmitir alguma emoção, mas o que emociona uma pessoa pode não emocionar outra, então, é a dedicação e a paciência que vão fazer o fotógrafo conseguir resultados melhores”, define.
Claro que nem sempre as coisas saem como planejado, como de resto em praticamente nada em uma boa trilha. Mas mesmo perrengues como dar de cara com um grande puma macho, em pleno Parque Nacional Patagônia, no Chile, podem resultar em um registro inédito.
“Essa foi uma sequência das que mais me marcaram porque, além da emoção de estar frente a frente com ele, em certo momento o puma ficou em posição de ataque, olhando nos meus olhos, e isso nunca mais vou esquecer, mesmo que as fotos nem tenham ficado muito bonitas, porque estava bem escuro e eu não tinha lente boa para aquela falta de luz”, lembra Feres.
É bom saber que nem esses feras (os fotógrafos, não o puma) se acham perfeitos, né não?
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