Governo chavista expulsou missões de governos que questionaram resultado das eleições; protestos 1 dia antes do evento terminam com opositora presa
O governo da Venezuela rompeu relações com pelo menos 8 países da América Latina desde que a Justiça do país declarou a vitória do presidente Nicolás Maduro, com 51% dos votos, nas eleições de julho de 2024. O chavista toma posse para um 3º mandato nesta 6ª feira (10.jan.2025).
Argentina, Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e o Uruguai tiveram as missões diplomáticas expulsas de Caracas em 29 de julho– 1 dia depois do pleito. Os governos desses países haviam questionado o resultado eleitoral. A oposição alega que houve fraude.
A custódia das embaixadas da Argentina e do Peru foi assumida pela diplomacia brasileira –que também não reconheceu a vitória de Maduro e cobrou a divulgação das atas eleitorais. A intervenção buscou preservar as instalações. No caso argentino, havia ainda 6 venezuelanos asilados no local.
Mais recentemente, na 2ª feira (6.jan), o governo venezuelano rompeu as relações com o Paraguai, depois de o presidente Santiago Peña (Partido Colorado, de direita) receber e declarar apoio ao presidente autoproclamado Edmundo González (Plataforma Unitária Democrática, centro-direita), que disputou com Maduro em julho de 2024.
Por outro lado, o regime de Maduro foi reconhecido pela Bolívia, de Luís Arce (Movimento ao Socialismo, de esquerda); Cuba, de Miguel Díaz-Canel (Partido Comunista de Cuba, de esquerda); pela Nicarágua, de Daniel Ortega (Frente Sandinista de Libertação Nacional, de esquerda) e por Honduras, de Xiomara Castro (Partido Liberdade e Refundação, de esquerda).
BRASIL X VENEZUELA
Apesar de não ter rompido, a relação entre o regime chavista e o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também se deteriorou no período.
O Brasil, que era um dos principais aliados da Venezuela na região, disse que não reconheceria a vitória de Maduro até a publicação das atas das urnas –medida que nunca foi tomada pela Justiça Eleitoral do país.
O estremecimento atingiu o auge depois que o Brasil vetou a entrada da Venezuela nos Brics. O governo Maduro classificou a medida como uma “agressão” e comparou o governo do petista ao do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Com a sequência de atritos, Lula não irá à posse do ex-aliado. Pode enviar uma embaixadora brasileira em Caracas, Glivânia de Oliveira, no lugar.
G7 APOIA GONZÁLEZ; CARACAS AMEAÇA
Em um parecer conjunto divulgado em novembro de 2024, os chanceleres do G7, o grupo das 7 maiores economias do mundo, reiteraram o reconhecimento à vitória de González nas eleições venezuelanas.
Na sequência, o governo chavista disse que irá rever as relações diplomáticas com cada país.
“É particularmente irônico que estes mesmos países, que fizeram o maior estrondo do ridículo em 2019 ao reconhecerem um impostor como ‘presidente interino’, estejam dando lições sobre vontade popular e processos eleitorais. Tentam, a partir do complexo colonialista e imperialista, preparar o terreno para desrespeitar as instituições e as decisões do povo venezuelano com a fantasia de um Guaidó 2.0 que voltará a chocar contra a dignidade dos herdeiros de Simón Bolívar”, diz o comunicado da chancelaria venezuelana.
Eis os países que integram o G7:
- Estados Unidos;
- Canadá;
- Reino Unido;
- França;
- Alemanha;
- Itália; e
- Japão.
PROTESTOS E PRISÃO DE CORINA
Milhares de venezuelanos foram às ruas contra Maduro 1 dia antes da posse. Atos foram registrados em Caracas, Mérida e Chacao. A ex-congressista María Corina Machado encabeçou as manifestações. Ela é a principal opositora de Maduro e é aliada de González.
Depois de deixar uma manifestação na capital, María Corina foi abordada e detida, segundo a oposição. Ela teria sido sequestrada, sendo “violentamente interceptada” depois de “agentes do regime” atirarem contra o traslado da política. A opositora teria sido liberada cerca de uma hora depois.
Os fatos se tornaram alvo de debate na Venezuela. O ministro da Comunicação, Freddy Ñáñez, disse que a equipe de Maria Corina teria forjado a perseguição e os chamou de “fascistas”.
Ele publicou um vídeo que circula nas redes sociais em que a opositora diz que está bem. No entanto, a oposição alegou que Corina foi obrigada a gravar o registro. Ela não fazia aparições públicas há pelo menos 5 meses.
“Estou bem, estou segura. Hoje é 9 de janeiro e participamos de uma concentração maravilhosa. Fui empurrada, minha bolsa caiu, a bolsinha azul onde estavam meus pertences caiu na rua, mas estou viva”, disse a líder da oposição venezuelana no registro.
No vídeo, María Corina aparece com um casaco preto e com o rosto coberto por um capuz. Sentada no meio-fio, ela segura o que aparenta ser uma garrafa d’água e fala em tom baixo e trêmulo.
VENEZUELA SOB MADURO
A Venezuela vive sob uma autocracia chefiada por Nicolás Maduro, 62 anos. Não há liberdade de imprensa. Pessoas podem ser presas por “crimes políticos”. A OEA publicou nota em maio de 2021 (PDF – 179 kB) a respeito da “nomeação ilegítima” do Conselho Nacional Eleitoral.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos relatou abusos em outubro de 2022 (PDF – 150 kB), novembro de 2022 (PDF – 161 kB) e março de 2023 (PDF – 151 kB). Relatório da Human Rights Watch divulgado em 2023 (PDF – 5 MB) afirma que 7,1 milhões de venezuelanos fugiram do país desde 2014.
Maduro nega que o país viva sob uma ditadura. Diz que há eleições regulares e que a oposição simplesmente não consegue vencer.
As eleições presidenciais realizadas em 28 de julho de 2024 são contestadas por parte da comunidade internacional. A principal líder da oposição, María Corina, foi impedida em junho de 2023 de ocupar cargos públicos por 15 anos. O Supremo venezuelano confirmou a decisão em janeiro de 2024. Alegou “irregularidades administrativas”que teriam sido cometidas quando era deputada, de 2011 a 2014, e por “trama de corrupção” por apoiar Juan Guaidó.
Corina indicou a aliada Corina Yoris para concorrer. No entanto, Yoris não conseguiu formalizar a candidatura por causa de uma suposta falha no sistema eleitoral. O diplomata Edmundo González assumiu o papel de ser o principal candidato de oposição.
O Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, controlado pelo governo, anunciou em 28 de julho de 2024 a vitória de Maduro. O órgão confirmou o resultado em 2 de agosto de 2024, mas não divulgou os boletins de urnas. O Tribunal Supremo de Justiça venezuelano, controlado pelo atual regime, disse em 22 de agosto de 2024 que os boletins não serão divulgados.
O Centro Carter, respeitada organização criada pelo ex-presidente dos EUA Jimmy Carter (1924-2024), considerou que as eleições na Venezuela “não foram democráticas”. Leia a íntegra (em inglês – PDF – 107 kB) do comunicado.
Os resultados têm sido seguidamente contestados pela União Europeia e por vários países individualmente, como Estados Unidos, México, Argentina, Costa Rica, Chile, Equador, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai. O Brasil não reconheceu até agora a eleição de Maduro em 2024, mas tampouco faz cobranças mais duras como outros países que apontam fraude no processo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou a dizer não ter visto nada de anormal no pleito do país.
A Human Rights Watch criticou os presidentes Lula, Gustavo Petro (Colômbia) e Andrés Manuel López Obrador (México) em agosto de 2024. Afirmaram em carta enviada aos 3 ser necessário que reconsiderem suas posições sobre a Venezuela e criticaram as propostas dos líderes para resolver o impasse, como uma nova eleição e anistia geral. Leia a íntegra do documento (PDF – 2 MB).