Em agosto, após o jornal Folha de S.Paulo expor a atuação do gabinete paralelo de Alexandre de Moraes dentro da estrutura do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), parlamentares da oposição iniciaram um movimento pelo impeachment do ministro, elevando o assunto a prioridade da direita no Congresso.
Em setembro, quando Moraes decidiu suspender o X, o movimento se intensificou: líderes da oposição na Câmara e no Senado chegaram a atuar para tentar obstruir votações no Congresso enquanto o impeachment do ministro não fosse pautado. O objetivo era pressionar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que sempre foi contra o processo contra Moraes.
Naquele período, um grupo de parlamentares da oposição chegou a convocar uma coletiva de imprensa para apresentar o “Manifesto em Defesa da Verdadeira Democracia”. O grupo lançou um pedido de impeachment de Moraes respaldado por mais de 1,3 milhão de assinaturas de cidadãos brasileiros.
Além das ações no Congresso, os parlamentares convocaram a população para uma manifestação na Avenida Paulista no dia 7 de setembro, com o propósito de reivindicar a normalidade democrática, anistia a perseguidos políticos e a instalação de uma CPI para apurar abusos de autoridade.
Nenhum desses temas avançou como a oposição desejava. Além disso, nos últimos meses, parlamentares de oposição se engajaram de forma intensa em assuntos sem relação com a pauta de combate aos abusos do Supremo, como o fim da escala 6×1, a regulamentação das emendas parlamentares e, mais recentemente, na semana passada, a castração química de pedófilos e a reforma tributária.
Questionada pela Gazeta do Povo sobre a perda de fôlego da pauta contra a censura do Judiciário, a deputada Bia Kicis (PL-DF), líder da minoria na Câmara, diz que a mudança é estratégica: sem a maioria para aprovar projetos ou viabilizar o impeachment de um ministro, a única alternativa é usar o parlamento para falar.
“Jamais abandonamos nossa luta pela liberdade de expressão. Infelizmente, não contamos com número suficiente de parlamentares para obstruirmos as sessões. Assim, tivemos que seguir uma nova estratégia: denunciar incansavelmente os abusos e a censura, em todas as nossas falas, seja em comissões ou em Plenário”, explica.
Não houve retorno à normalidade, mas com Pacheco não há saída, diz Portinho
Líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ) assegura que “não houve nenhum retorno à normalidade”. “O que aconteceu é que a gente protocolou o impeachment, tem cobrado, mas percebeu que, com o Pacheco, que é o avalista de tudo isso, [a pauta anticensura] provavelmente não vai andar. A gente está agora buscando construir alternativas para poder pressionar o Poder Judiciário numa nova gestão”, relata.
Enquanto isso, diz Portinho, é necessário ser pragmático e buscar outras pautas de interesse da oposição. “A obstrução é algo muito bonito, mas, para fazer obstrução, tem que ter maioria, porque senão você não obstrui nada. Só pode haver derrota para o governo se a obstrução for a uma emenda constitucional. Fora isso, a gente não tem número de parlamentares. É preciso que se entenda que são 81 senadores, e a oposição tem, no máximo, 32”, afirma.
A esperança, para Portinho, está nas eleições de 2026, quando haverá renovação de dois terços do Senado. Enquanto isso, diz ele, “é preciso ter estratégia numa batalha, ou ela termina rápido, com todos mortos”.
“A gente quer continuar essa batalha, mas a gente precisa ter estratégia para vencer. A nossa vitória virá em 2026, não tenho a menor dúvida. Mas, até lá, a gente tem que ir se posicionando, mas sabendo quais são as nossas limitações”, comenta. “A população elegeu uma bancada conservadora grande no Senado, sim, mas elegeu um centro que hoje é cooptado pelo governo”, acrescenta.
Oposição não tem força para impor qualquer pauta, diz analista
Para o cientista político Antonio Flávio Testa, os parlamentares dependem muito dos líderes dos partidos, que hoje estão sempre em negociação com o governo e enredados pelo Judiciário por diversas questões, o que não lhes permite aderir a pautas como o impeachment do STF. Por isso, os deputados e senadores de oposição mais engajados na pauta anticensura dificilmente obterão grandes vitórias neste momento.
“Eles falam: ‘Nós vamos bloquear, vamos travar toda a pauta’. Não vão, porque quem manda no processo legislativo são os líderes dos partidos, que definem o comportamento das suas bancadas. E todos eles fazem negócios econômicos e políticos, e dependem de negociação com o governo”, diz. “O STF é, de fato, quem governa o Brasil hoje. Dentro do STF, há três ou quatro ali que definem o que o Brasil vai fazer. O Brasil está vivendo um jogo muito diferente do processo político tradicional numa democracia. Isso esvazia a pauta da oposição, por conta de pressão interna e externa.”
As reações mais exaltadas da oposição e as promessas de obstruir pautas no Congresso, segundo ele, jogam para as redes sociais, mas não são realistas. Além disso, para ele, é inviável que a oposição deixe de abordar outros assuntos à espera de que a pauta anticensura avance.
“O presidente da Câmara e do Senado é que definem a pauta. É um jogo muito restrito. E não adianta ficar batendo, batendo, porque não vai mudar. E os parlamentares têm muitos interesses regionais, claro. São representantes dos seus estados, dos seus municípios. E isso interfere no comportamento deles”, avalia.