Criado durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro para auxiliar restaurantes e o setor de eventos durante a pandemia, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) é mais um exemplo de política pública de isenções fiscais mal avaliada, não isonômica e sem prazo definido. A iniciativa visava zerar as alíquotas de tributos federais como IRPJ, CSLL e PIS/Cofins para determinados setores. Contudo, tem se mostrado ineficaz para a recuperação econômica pretendida e evidencia problemas estruturais na formulação de políticas fiscais no Brasil.
Há alguns meses, o presidente Lula demonstrou surpresa com o aumento dos subsídios no país, que atingiram R$ 646,6 bilhões em 2023, equivalentes a 5,96% do PIB, segundo relatório do Tribunal de Contas da União. Essa reação, além de descolada da realidade, reflete como nossos políticos vão concedendo regimes especiais sem ter dimensão das consequências.
Inicialmente, o Perse listou 43 CNAEs como elegíveis ao benefício, desde que pertencentes ao ramo de eventos. No início do atual governo, uma portaria do Ministério da Fazenda reduziu essa lista pela metade, gerando disputas judiciais com 1.368 empresas que buscam manter as desonerações. Grandes companhias como iFood, Uber e 99taxi estão entre as que acionaram a Justiça, argumentando que o programa tinha duração fixa de 30 meses e não poderia ser alterado durante sua vigência.
Na prática, incentivos fiscais acabam gerando ou fortalecendo lobbies existentes nos setores, tornando difícil o encerramento dos programas. Uma vez concedidos os benefícios, grupos de interesse mobilizam recursos para mantê-los, independentemente da efetividade das medidas. Esse processo, por sua vez, gera uma dinâmica perversa na qual a sociedade arca com os custos das concessões feitas a setores específicos. Ao mesmo tempo que o cidadão comum e empresários sem o mesmo poder de influência acabam pagando impostos mais elevados.
Afinal, cada novo benefício fiscal concedido a um segmento resulta em distorções que oneram outros contribuintes. Por exemplo, os críticos da reforma tributária apontam com razão para a possibilidade de o Brasil ter uma das maiores alíquotas de IVA do mundo. Entretanto, devemos lembrar que esse cenário é, na verdade, consequência de um processo político disfuncional, onde privilégios são distribuídos sem avaliação e cuja revogação é dificílima. No final, entramos em ciclo vicioso de benefícios fiscais que cria uma dinâmica danosa em que a sociedade sempre arca com o custo das concessões feitas a grupos de interesse.
Como nação, temos dificuldade de implementar regras de forma igualitária para todos os setores, graças à nossa dinâmica política de conceder privilégios. Ficamos concedendo regimes especiais para quem tem poder de lobby ao invés de criar uma estrutura de gastos públicos que garanta a redução de impostos para todos.
Sem uma avaliação de resultados e impacto, continuamos a alimentar uma estrutura fiscal desigual, ineficiente que demanda cada vez mais impostos para ser sustentada. Precisamos adotar práticas que valorizem a avaliação contínua e a transparência, garantindo que as medidas adotadas sirvam ao interesse público e não a grupos específicos.
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