A notícia-crime da campanha de Guilherme Boulos (PSOL) contra Tarcísio de Freitas (Republicanos) pela declaração que vinculava o então candidato ao PCC tem pouca chance de tornar o governador de São Paulo inelegível, avaliam três ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e de tribunais superiores com trânsito na cúpula do Judiciário.
Eles afirmaram à Folha, sob reserva, que a fala de Tarcísio teve impacto pequeno ou nulo no resultado final da eleição. Ricardo Nunes (MDB) já aparecia nas principais pesquisas de intenção de votos com larga vantagem sobre Boulos.
Ainda no domingo a campanha de Boulos protocolou duas medidas na Justiça Eleitoral.
Uma é a notícia-crime no TSE. O objetivo nesse processo é fazer com que o Ministério Público Eleitoral peça a abertura de um inquérito pela PF e, posteriormente, apresente uma ação judicial contra Tarcísio e Nunes.
O relator no TSE é o ministro Kassio Nunes Marques, vice-presidente da corte eleitoral. A equipe do ministro deve se debruçar sobre o caso nas próximas semanas.
A campanha de Boulos diz na peça que a “utilização do cargo de governador do estado com a finalidade de interferir no resultado da eleição, no dia da votação, é evidente”, até “pela escolha do momento para divulgação da coletiva, durante o horário da votação, com a presença dos candidatos”.
A ação cita a circulação da declaração em aplicativo de mensagens e diz ter existido uma ação coordenada “para difundir essas acusações, de forma abusiva e criminosa, durante o horário de votação”.
A outra medida é tecnicamente chamada de Aije (ação de investigação judicial eleitoral) e está agora na Justiça Eleitoral de primeira instância em São Paulo. O pedido da campanha de Boulos é pela inelegibilidade de Tarcísio, Nunes e Mello Araújo (vice) por oito anos, além da cassação do diploma da chapa do prefeito.
A acusação é a de que a fala do governador configurou abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação social. Ação pode em seguida subir para análise do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo e depois ao TSE, a última instância da Justiça Eleitoral.
Dois ministros do TSE afirmaram à reportagem que é preciso avaliar as circunstâncias em que Tarcísio deu a declaração. O fato de o governador ter falado sobre o caso durante entrevista coletiva, após publicação de reportagem na véspera que expunha a suposta orientação de votos de integrantes do PCC a Boulos, suavizaria a situação do político, para esses ministros.
A leitura que se faz nos bastidores é que Tarcísio errou ao lançar suspeitas de apoio do PCC a Boulos, sem apresentar provas, no dia da eleição. Segundo essa avaliação, porém, a inelegibilidade seria medida desproporcional à declaração do governador, que teria baixo potencial de interferir no pleito.
Para os ministros ouvidos pela Folha, as ações contra Pablo Marçal (PRTB) têm mais chances de avançar na Justiça Eleitoral —em especial, aquela em que o ex-candidato é acusado de divulgar laudo falso sobre uso de drogas para atacar Boulos às vésperas do primeiro turno.
O caso está no TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo) e só será levado ao TSE caso alguma das partes questione a sentença proferida pelos desembargadores. O processo ainda não foi julgado.
Procuradas, as assessorias de Tarcísio, Boulos e Marçal não se manifestaram.
O governador disse no domingo (27), sem apresentar provas, que integrantes do PCC orientaram familiares e apoiadores a votarem em Boulos para prefeito de São Paulo.
A declaração foi dada no colégio Miguel Cervante, na zona sul, logo após o governador votar. Na entrevista coletiva, Tarcísio foi questionado sobre a violência em algumas campanhas.
“A gente vem alertando sobre isso há muito tempo. Nós fizemos um trabalho grande de inteligência. Então a gente pegou e reforçou o policiamento nas grandes cidades onde está tendo segundo turno”, respondeu.
“Vamos aí ter muitas conversar com o Tribunal Regional Eleitoral para ver os relatórios que mostram os locais que tiveram conexão com o crime organizado”, completou Tarcísio, antes de ser indagado sobre o que aconteceu na capital.
“Houve interceptação de conversas e de orientações que eram emanadas de presídios de uma facção criminosa orientando determinadas pessoas de determinadas áreas a votarem em determinados candidatos.”
O governador foi então questionado pela Folha sobre qual era o candidato indicado pelo PCC em São Paulo, ao que Tarcísio respondeu: “Boulos”.
Informes de inteligência do governo do estado ligados à SAP (Secretaria de Administração Penitenciária) começaram a circular no final de semana da eleição. A Folha obteve acesso a alguns deles. Em linhas gerais, contêm reproduções de bilhetes apreendidos com detentos com orientações para voto deles ou de familiares em Boulos.