A Argentina tem sido motivo de inveja para nós, brasileiros.
Os católicos invejam o Papa, figura além de mui simpática, verdadeiramente cristã, daquelas da Igreja que fez a opção preferencial pelos pobres.
Sim, não são poucos os brasileiros que, do outro lado, o chamam de comunista. Entre os Faria Limers há uma porção deles.
Os cinéfilos invejam os hermanos por filmes como “Argentina, 1985”, indicado para o Oscar dos filmes estrangeiros e uma aula de cinema e de história, ao contar por que nunca mais o militar argentino pensará em dar golpe de Estado. Aqueles que deram foram, ao contrário do acontecido por aqui, exemplarmente punidos. Impossível pensar num 8 de janeiro em Buenos Aires como vivemos em Brasília.
É verdade que não temos motivos para invejar a beleza do tango porque nossa música está em outro patamar, assim como o doce de leite, a carne, a literatura etc. Basta apreciá-los como merecem.
Assim como o futebol, escola tão boa como a nossa, de Alfredo Di Stéfano, Diego Maradona e Lionel Messi.
Ainda temos duas Copas do Mundo a mais além do Rei Pelé, Mané Garrincha, Romário, os Ronaldos, tantos.
Já a festa feita no reformado Monumental de Núñez, agora com capacidade de 83 mil hinchas, o maior da América do Sul, para receber o primeiro jogo dos campeões no Qatar, foi sim invejável.
Além de ter sido muito legal ver como o SporTV tratou o evento, sem economizar elogios aos nossos principais rivais.
Reconhecer a façanha do tricampeonato, a excelência e a genialidade de Messi, faz justiça à epopeia vivida na Copa de 2022 e significa um passo adiante para superar a frase do sociólogo argentino Pablo Alabarces, da Universidade de Buenos Aires: “Os brasileiros amam odiar os argentinos, enquanto os argentinos odeiam amar os brasileiros”.
Seguiremos peleando pelos gramados do Planeta Bola e será mesmo muito melhor se cada um olhar com o respeito devido a cada outro.
E vejam a rara leitora e o raro leitor que houve um momento no jogo, contra o time B do Panamá, mais famoso pelo canal que pelo futebol, capaz de transformar a inveja em despeito: o jogo chegava aos 60 minutos e 80 mil torcedores não haviam gritado gol nenhuma vez, porque Messi batia faltas nas traves, porque o goleiro panamenho fazia com gosto o papel de estraga-prazeres e o vinho de Mendoza estava a meia hora de virar sangria.
Daí aconteceu o gol do desafogo na segunda cobrança do ET devolvida pelo travessão para Almada abrir o placar e, dez minutos depois, outro para coroar a ocasião, de Messi, em nova cobrança de falta, para celebrar o 800° gol de sua impecável carreira.
Como inveja pouca é bobagem, terminado o jogo, Messi discursou, o técnico Lionel Scaloni discursou, todos os jogadores apareceram com suas mulheres, filhas e filhos, réplicas da taça nas mãos e deram a volta olímpica —fizeram, enfim, tudo a que tinham direito.
Comemoração incomparavelmente mais tocante que a do tri brasileiro em 1970, e aí a explicação é singela: como nós, brasileiros, os argentinos vivem, com todas as dificuldades enfrentadas depois de governos ditos neoliberais, em plena democracia.
É a leveza dos ares da liberdade que permite aos povos festejar sem medo de serem felizes.
Viva Francisco, Ricardo Darín, Carlos Gardel, Astor Piazzolla, Di Stéfano, Maradona e Messi.
E o dulce de leche!
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