Deslizamentos de terra atingem casas multimilionárias na Califórnia


Os deslizamentos de terra profundos sob as casas multimilionárias em Rancho Palos Verdes, na Califórnia, se moviam a uma velocidade quase glacial, ou seja, bem lentamente. Até que pararam de se mover assim.

Esta cidade costeira afluente no sul da Califórnia, a cerca de 48 quilômetros ao sul de Los Angeles, há muito atrai pessoas interessadas nas vistas do Oceano Pacífico e na  vegetação exuberante. No entanto, ela está situada sobre um complexo de deslizamentos de terra de movimento lento que estão ativos desde a década de 1950, fazendo com que o terreno se desloque por alguns metros por ano. Mas recentemente, depois de chuvas intensas no inverno, o ritmo e a escala do movimento aumentaram.

No último fim de semana, uma aceleração drástica trouxe consequências devastadoras.

As casas agora estão espalhadas de forma irregular sobre um terreno distorcido, estradas se deformaram e a energia foi cortada para mais de 200 residências. Na terça-feira (3), o governador Gavin Newsom declarou estado de emergência na cidade.

A visão de casas luxuosas à beira-mar pendendo precariamente sobre penhascos ou parcialmente engolidas pelo solo não é incomum nesta parte dos EUA. Deslizamentos de terra destroem casas, ceifam vidas e deixam as comunidades temendo pelo seu futuro.

Mas os cientistas alertam que esses eventos devem se tornar mais frequentes à medida que a crise climática provoca chuvas mais intensas e tempestades mais poderosas, remodelando paisagens.

Os deslizamentos de terra dependem de três fatores: a inclinação, o tipo de rocha e o clima, afirmou Alexander Handwerger, cientista de deslizamentos de terra no Laboratório de Propulsão a Jato da NASA.

Rancho Palos Verdes está situado sobre uma camada de cinzas vulcânicas, depositada entre 10 e 15 milhões de anos atrás, que inclina-se em direção à costa do Pacífico.

“Essa camada se transformou em um tipo de mineral argiloso que pode expandir e ficar escorregadio quando molhado,” disse Gary Griggs, professor distinto de ciências da Terra e planetárias na Universidade da Califórnia em Santa Cruz.

Diversos fatores podem desencadear deslizamentos de terra, incluindo terremotos e atividades humanas. Mas a chuva é uma das causas mais comuns.

À medida que chove, a água se infiltra no solo, peenetrando nas camadas abaixo. Lá, ela pode reduzir a sucção e o atrito que mantêm unidos os grãos de solo ou rocha, fazendo com que o terreno enfraqueça e se desloque.

As inclinações estão sempre tentando alcançar um ângulo estável, que depende do tipo de clima em que se encontram, disse Dave Petley, cientista da Terra na Universidade de Hull, na Inglaterra. Se o clima mudar e a chuva se tornar mais intensa, a inclinação “pode agora estar muito acentuada para ser estável, então sofrerá um deslizamento de terra ou uma série de deslizamentos para encontrar um novo ângulo estável,” ele afirmou à CNN.

Na Califórnia, a mudança climática está forçando a paisagem a se adaptar.

Nos últimos dois anos, rios atmosféricos — longas faixas de umidade no céu que vêm dos trópicos — têm atingido o estado com chuvas intensas.

Em fevereiro desta ano, um rio atmosférico despejou quantidades recordes de chuva no sul da Califórnia, provocando centenas de deslizamentos de terra e deixando pelo menos nove pessoas mortas.

A chuva desgastou as encostas; uma imagem impactante mostra um pequeno grupo de mansões em Dana Point perigosamente perto de cair na praia cheia de entulho abaixo.

Tempestades causam deslizamentos em Dana Point, Califórnia, e deixarm mansões em risco de desabamento
Tempestades causam deslizamentos em Dana Point, Califórnia, e deixarm mansões em risco de desabamento • Allen J. Schaben / Los Angeles Times via Getty Images

Os cientistas encontraram ligações claras entre a crise climática e a intensificação das chuvas. Uma atmosfera mais quente pode reter mais umidade, resultando em chuvas ou nevadas mais intensas quando ocorrem, e oceanos mais quentes alimentam tempestades mais poderosas.

Na Califórnia, as projeções climáticas sugerem que o estado terá chuvas menos frequentes, mas mais intensas no futuro, especialmente a partir dos rios atmosféricos, que devem se tornar mais potentes à medida que o mundo esquenta.

O risco de deslizamentos de terra é evidente, disse Handwerger, que publicou um estudo sobre o tema em 2022. “Analisamos todo o estado e vemos que em anos mais úmidos do que a média, os deslizamentos de terra aceleram.”

A crise climática também aumenta outros riscos de deslizamentos de terra. A elevação do nível do mar e a ressaca estão desgastando as encostas. Verões mais quentes e secos estão aumentando a frequência e a gravidade dos incêndios florestais, tornando a paisagem mais vulnerável a deslizamentos de lama, disse Griggs.

Os fluxos de lama de 2018 que devastaram Montecito, matando 23 pessoas, seguiram o incêndio Thomas, que na época era o maior incêndio florestal da história da Califórnia e que incinerou árvores e plantas.

Os deslizamentos de terra são, é claro, um fenômeno global, e os cientistas estão identificando riscos de deslizamentos de terra impulsionados pela mudança climática em todo o mundo.

O ciclone Gabriel na Nova Zelândia desencadeou mais de 140 mil deslizamentos de terra mapeados — e possivelmente mais de 800 mil no total, acreditam os pesquisadores.

Em julho, um deslizamento de terra provocado por chuvas intensas no estado de Kerala, no sul da Índia, matou pelo menos 150 pessoas. A chuva foi pelo menos 10% mais intensa devido à crise climática, de acordo com uma análise científica.

A mudança climática não é o único fator que aumenta a probabilidade de deslizamentos de terra; o comportamento humano também tem impacto.

Cortar encostas para nivelar áreas para construção de casas ou estradas pode enfraquecê-las e tornar as encostas instáveis, disse Ugur Öztürk, cientista de deslizamentos de terra na Universidade de Potsdam e no GFZ German Research Centre for Geosciences.

Além disso, adicionar água em excesso ao solo também pode ser um problema, disse Griggs. No sul da Califórnia, “as pessoas queriam fingir que viviam nos trópicos,” disse ele, “e plantaram muitas áreas ajardinadas que exigiam muita rega.”

O desmatamento é outro fator. Raízes de árvores e plantas seguram o solo e removê-las pode desestabilizar o terreno, disse Petley, da Universidade de Hull.

Mas ele acrescentou: “A mudança climática é fundamental.”

Para os residentes de Rancho Palos Verdes, onde o solo está se movendo até 30 centímetros por semana, o futuro da comunidade está em jogo. Não está claro quando o movimento vai desacelerar, ou se eles poderão salvar suas casas da destruição.



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