O Ibovespa perdeu o fôlego nesta quinta-feira (23) e trabalhou abaixo dos 100 mil pontos pela primeira vez em nove meses. Às 12h11, o índice de referência da bolsa de São Paulo, a B3, caía 0,47%, a 99.747,83 pontos. Esse movimento teve as varejistas Magazine Luiza e Via entre as maiores quedas, após o BC (Banco Central) sinalizar, no dia anterior, haver pouco espaço para corte de juros no país.
Um pouco mais cedo, o Ibovespa chegou a 101.125,76 pontos, endossado por Wall Street e refletindo ajustes. O volume financeiro somava R$ 7 bilhões.
A queda se acentuou no início da tarde: às 14h10, o índice operava em queda de 1,48%, a 98.739,67 pontos.
Nesta quarta-feira (22), o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC decidiu manter a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 13,75% ao ano, reforçando que “irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que mostrou deterioração adicional”.
Além dos reflexos no custo do dinheiro, o posicionamento da autoridade monetária corrobora o receio de um acirramento da tensão entre o governo e o banco, uma vez que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esperava a redução da Selic e vinha pressionando a instituição.
“No mercado, há a percepção de que a temperatura esquentará ainda mais entre o presidente Lula e o BC, com mais troca de farpas, pressão e críticas, o que pode contaminar o cenário”, falou o superintendente da Necton/BTG Pactual, Marco Tulli.
“As medidas recentes do governo vão contra o movimento feito pelo Copom, que foi mais duro do que o governo esperava”, acrescentou.
O comunicado do BC reforçou a visão de grandes bancos, de que reduções na Selic ficarão para o segundo semestre do ano, possivelmente só para o final desse período.
Para o economista-chefe da Mirae Asset Wealth Management (Brazil) CCTVM, Julio Hegedus Netto, será inevitável o escalonamento das tensões entre a instituição e o Executivo, conforme relatório enviado a clientes nesta quinta.
“Havia um debate em torno de como o BCB iria responder às ‘demandas’ do governo. Se cedesse, sinalizando redução da Selic neste ano, poderia mostrar perda de autoridade, e se mantivesse uma conduta mais ‘hawkish’ [comportamento agressivo, incisivo; na economia, indica postura de combate à inflação pelo aumento dos juros], como acabou ocorrendo, seria interpretado como intransigente na defesa da autonomia e atuação como ‘guardião da moeda’. Optou pela segunda opção.”
Hegedus Netto acrescentou que “a impressão que se tem é que, nesta escalada, quanto mais o governo ‘protestar’ contra a política de juros, mais o BC deve endurecer, isso, claro se piorarem as expectativas fiscais e inflacionárias”.
Ele avalia que a ‘paz’ pode ser estabelecida se houver um avanço concreto no encaminhamento do ajuste fiscal, e um arcabouço fiscal consistente e abrangente.
Análise técnica do Itaú BBA apontou que, após a queda da véspera, o Ibovespa abriu caminho para mais baixas, em direção aos 97 mil e 95,2 mil pontos.
“Existe alguma expectativa para reverter esse cenário? Sim, mas será preciso superar a primeira resistência em 102.500 pontos para iniciar um repique, que poderá estender até os 106.700 pontos. A partir daí, então, é que veremos um alívio de fato”, afirmaram Fábio Perina e equipe do Itaú BBA, em relatório.
Para abandonar a tendência de baixa, o Ibovespa precisa ultrapassar os 106.700 pontos, disseram.
Nos Estados Unidos, Wall Street tinha uma sessão positiva, o que endossou os ganhos no pregão brasileiro mais cedo.
Alguns destaques
– MAGAZINE LUIZA ON recuava 10,31%, a R$ 3,22, e VIA ON perdia 4,52%, a R$ 1,9; a avaliação é de que a decisão e a sinalização do BC minaram apostas de um alívio no aperto monetário no Brasil, desencadeando um ajuste para cima na curva futura de juros.
– GOL PN cedia 6,77%, a R$ 6,2, e AZUL PN caía 5,29%, a R$ 11,63, afetadas também pela alta do dólar ante o real.
– MINERVA ON avançava 2,74%, a R$ 11,61, após a China concordar em retomar imediatamente as importações de carne bovina brasileira com menos de 30 meses. JBS ON tinha alta de 0,54%, enquanto MARFRIG ON caía 3,12%.
– NATURA&CO ON subia 0,75%, a R$ 13,43, apoiada em expectativas relacionadas a desinvestimento pela fabricante de cosméticos.
– BRASKEM PNA recuava 3,71%, a R$ 16,85, após divulgar prejuízo líquido no quarto trimestre do ano passado, acima da perda registrada um ano antes. A receita líquida caiu 33%.
– ITAÚ UNIBANCO PN subia 0,04%, a R$ 23,75, enquanto BRADESCO PN abandonou o sinal positivo, registrando declínio de 1,92%, a R$ 12,77.
– PETROBRAS PN cedia 0,34%, a R$ 23,25, apesar da melhora dos preços do petróleo no exterior.
– VALE ON operava estável, a R$ 81,68, em dia negativo para os futuros do minério de ferro na Ásia.