A pequena cidade histórica, responsável por abrigar grande parte dos construtores e primeiras empresas da capital, segue como refúgio
Conhecida pela gastronomia, a Vila Planalto, que completa 66 anos nesta segunda-feira (3), se tornou, ainda na juventude de Brasília, um dos pontos de referência quando o assunto é alimentação saborosa e bem feita.
Atrás da Esplanada dos Ministérios, em localização privilegiada – a apenas 3,2 km da Praça dos Três Poderes e do Palácio do Planalto –, a pequena cidade histórica, responsável por abrigar grande parte dos construtores e primeiras empresas da capital, segue como refúgio gastronômico de figuras públicas e servidores dos ministérios ao longo do Eixo Monumental.
O Jornal de Brasília entrevistou alguns dos moradores e visitantes da cidade para entender se o movimento gerado nos restaurantes, cafeterias e lanchonetes da Vila é positivo ou negativo, uma vez que atrai muitas pessoas de fora da cidade apenas pela fama da boa gastronomia.
Para Bruna Pereira, de 35 anos, moradora da Vila há quatro, a qualidade da culinária da cidade é boa e consegue agradar aos paladares de muitas regiões do país. “Tem variedade. Aqui em Brasília temos pessoas de todos os estados [do Brasil] e aqui na Vila também. E a comida é ótima”, disse a policial militar.
“Isso é bom até para a economia daqui, para quem tem um empreendimento com alimentação. É um ponto muito positivo porque o público que vem, vem durante a semana [os dias úteis]. Então no sábado e domingo é mais vazio”, continuou. O restaurante preferido na cidade de Bruna é o Braseiro, na Avenida Rabelo, perto da entrada da cidade.
Segundo a servidora pública e empreendedora digital Eva Arantho, 49, a Vila Planalto possui uma alimentação de qualidade, porém com pouca variedade para os vegetarianos, como ela. Há cinco anos na cidade, entretanto, ela encontra locais que adaptam o cardápio ao regime alimentar dela, como o Yakiton, que apesar de ser especializado em comida oriental, prepara pratos dos quais a moradora consegue saborear sem preocupações.
“Não tenho costume de comer muito fora de casa, quase que apenas uma vez por mês, mas ali [no Yakiton] eu tenho que ir pelo menos umas quatro ou cinco vezes por semestre. Lá é ‘top’”, destacou. Ela complementa que também já encontrou, em um dos restaurantes da cidade, salgados veganos, como uma coxinha com jaca temperada, entre outros que ela também gosta.
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Ela reconhece que a dieta restritiva – sem alimentos de origem animal, fritura, glúten e lactose – a fazem não frequentar a maioria dos restaurantes da Vila, mas concorda que a movimentação é positiva para a cidade. “No meu trabalho [na Esplanada dos Ministérios], a primeira coisa que falam é sobre a culinária da Vila Planalto. As pessoas sempre falam que só há comida boa, e depois da proximidade com o trabalho”, disse.
“Eu esperei quatro anos para realizar meu sonho de morar aqui. Morava no Riacho Fundo, […] mas agora chego no trabalho em cinco ou seis minutos. Quando tem engarrafamento, demora 15 ou 20 minutos. É bem rápido. […] Os dias mais cheios são quarta, quinta e sexta-feira, porque é onde muitos servidores vêm almoçar. Isso valoriza muito a cidade”, finalizou.
Um dos frequentadores da cidade é Heitor Perpétuo, 40, morador do Altiplano Leste que conhece alguns dos principais restaurantes da Vila Planalto. Para ele, o local pertencente à primeira Região Administrativa do Distrito Federal, Plano Piloto, tem um “clima mais descontraído e agradável”. Ele foi ao restaurante Casarão para uma reunião de negócios.
“Conheço o Casarão, o Traíra e a Tia Zélia. Gosto muito da comida daqui. A Vila está se tornando um polo gastronômico por conta da proximidade e diversidade de restaurantes, que vemos pouco em outros bairros. Acho que isso é extremamente positivo [para a cidade] e até para quem não conhece a Vila, passar a conhecer a cidade como um todo, que se transformou ao longo do tempo”, afirmou. “Passa a ser uma área de descanso. Costumo vir na sexta para me desconectar do corporativo e se conectar com essa vibe mais natural.”
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
História gastronômica
A fama da gastronomia da Vila Planalto se iniciou com Rosental Ramos da Silva, o “Seu Rosa”, cozinheiro que conquistou o paladar do então presidente da República, Juscelino Kubitschek. Os dois se conheceram em Petrópolis no famoso hotel Palacio Quitandinha, quando o político ainda era prefeito de Belo Horizonte, Minas Gerais, antes da proibição de cassinos no Brasil, e Seu Rosa era um aprendiz de cozinheiro.
Depois da ocasião, os dois se encontraram novamente após a eleição de JK à presidência do Brasil. Em outro restaurante, desta vez no Rio de Janeiro capital, Seu Rosa serviu um banquete para Juscelino e uma comitiva política. Encantado com a culinária, o chefe do Executivo brasileiro indagou ao agora chef de cozinha: “Você sabe fazer essa comida toda? Olha, eu estou fazendo uma cidadezinha aí… Se eu precisar de você, você vai lá me atender?”
Consentindo com o pedido do presidente, Seu Rosa passou a ser chamado em muitas ocasiões para preparar banquetes em Brasília, além de fazer o prato preferido de JK: arroz, tutu à mineira, feijão, linguiça e torresmo à vontade. A história é contada no livro “Vizinhos do Poder”, de Leiliane Rebouças, escritora, pesquisadora, especialista e ativista pela conservação dos patrimônios de Brasília.
Após o mandato de JK, Seu Rosa voltou para o estado de origem, Rio de Janeiro, e em 1971 decidiu se instalar definitivamente em Brasília, primeiramente na Asa Norte, onde teve um bar, em um dos anexos do Brasília Palace Hotel, e posteriormente na Vila Planalto quando os moradores foram transferidos. Na cidade, ele fez da varanda da casa que construiu um restaurante.
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Com a fama do cozinheiro que conquistou o paladar de Juscelino, o estabelecimento pouco a pouco foi ganhando destaque e passou a ser visitado e frequentado por outros presidentes e autoridades políticas notórias da administração pública brasileira. Assim, a Vila Planalto não deixou mais de ser frequentada por servidores públicos em busca de boa culinária.