O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirma que seria uma “atrocidade” se o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) impedisse seu pai, Jair Bolsonaro (PL), de disputar as próximas eleições.
O ex-presidente está na mira de 16 ações na corte que podem torná-lo inelegível por oito anos.
“Eu acho que, se isso [inelegibilidade] acontecesse, seria a maior atrocidade das últimas décadas”, disse em entrevista à Folha. “Isso é interferir na democracia.”
Flávio avalia que, nesse caso, Bolsonaro se tornaria o maior cabo eleitoral do país.
Ex-coordenador da campanha derrotada à Presidência do pai, o senador diz temer que Bolsonaro seja morto ao retornar dos Estados Unidos, onde está desde dezembro de 2022.
O senador condena a devassa feita em dados de desafetos de Bolsonaro pela Receita Federal, revelada pela Folha, nega ter envolvimento com o caso e alega já ter sido vítima desse tipo de atuação do órgão.
Ele critica ainda o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas diz que não fará uma “oposição irresponsável” no Senado.
Por que o ex-presidente Bolsonaro foi para os Estados Unidos e está lá até hoje? Ele foi para lá para descansar, respirar outros ares e volta quando ele quiser.
O presidente do Republicanos, Marcos Pereira, que apoiou a candidatura de Bolsonaro, agora diz que ele é um turista nos Estados Unidos e não é líder da oposição. O sr. concorda? Olha, cada um escolhe sua liderança, né? Porque para mim, o Bolsonaro é o líder da oposição. Hoje não tem ninguém com a densidade eleitoral dele, do lado da centro-direita. Eu não vejo um vácuo aqui, até porque o Lula e a imprensa falam dele todo dia.
Ele teme ser preso no Brasil, por ser alvo de investigação no STF (Supremo Tribunal Federal) pelos atos de 8 de janeiro? Não. O que ele fez errado para ser preso? O que ele fez errado para ficar inelegível, como estão falando por aí?
Ele é investigado em 16 ações no TSE. Ações propostas pela oposição. São ações políticas. Eu confio que o Judiciário não vai se deixar contaminar. Se isso [inelegibilidade] acontecesse, seria a maior atrocidade das últimas décadas. Não tem razão de você querer tirar na canetada uma pessoa que claramente representa grande parte da sociedade. Isso é interferir na democracia.
Qual foi o peso de Michelle Bolsonaro na campanha? E qual o futuro político dela? Ela teve um peso grande na campanha. Eu acho que ela, perto do meu pai, dá uma humanizada nele.
Agora, sobre o futuro dela na política, é ela que vai poder dizer. Eu acho que ela tem um grande potencial. Mas assim, na minha cabeça, o candidato a presidente é o Jair Bolsonaro. Já Michelle tem grande chance de se eleger para o cargo que ela se candidatar. Tem que ver se ela vai querer.
Em caso de inelegibilidade de Bolsonaro, ela é uma opção para a Presidência? Eu não acredito na inelegibilidade dele. Tem que haver uma ruptura absurda com a lei, com a Constituição.
Se isso [inelegibilidade] acontecer… Agora, se isso acontecer, vai ser o nome que ele mandar, porque ele é liderança, ele que transferiria votos. Eu não tenho condição de dar nome nenhum.
Tem uma parcela gigante da população que está observando [o processo], aí certamente, se chegar a esse ponto [inelegibilidade], o Bolsonaro seria o maior cabo eleitoral da história do Brasil. Eu acho que com muito mais força até do que o nome dele sendo colocado. Porque o brasileiro tem isso de se solidarizar com quem sofreu uma injustiça.
O TSE então fortaleceria Bolsonaro e o bolsonarismo? Não tenho a menor dúvida.
E a Michelle seria… Não sei se a Michelle. Não posso lançá-la candidata a presidente.
Mas ela tem potencial? Qualquer um [tem potencial] se Bolsonaro pedir voto.
Tarcísio de Freitas (SP) é um governador com potencial de ser presidente? Ele é um quadro fenomenal. Se elege para o que ele quiser se candidatar.
Mesmo para presidente contra Bolsonaro? Isso não vai acontecer. Essa hipótese é zero.
Ele é leal? 100%.
Bolsonaro é acusado no TSE de ter feito um pacote eleitoreiro, turbinado o Auxílio Brasil e reduzido o preço de combustíveis. Não houve intenção eleitoreira. Houve necessidade da população. Ele fez o auxílio emergencial antes. A gente só manteve, inclusive o mesmo valor. A inflação estava subindo. E o preço do combustível impacta em toda a cadeia produtiva.
Outra ação é sobre ele ter colocado em xeque as urnas eletrônicas. Ele insistiu nesse discurso e, em 8 de janeiro, houve atos golpistas. O sr. vê responsabilidade do ex-presidente? Não há nenhuma vinculação do 8 de janeiro com essa ação no TSE. Não é questionar o processo eleitoral, ele sempre buscou mais transparência e segurança para o processo eleitoral. Seria obrigação do TSE. E, por querer mais transparência, mais segurança, não dá para tratar o Bolsonaro como alguém que é contra a democracia.
Foi encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres uma minuta golpista. Como explicar isso? O que foi feito com essa minuta? A validade desse documento é zero. O documento é apócrifo, não tem assinatura de ninguém. O fato de ter um papel aqui falando uma coisa mais absurda não significa que você vai usar aquilo para alguma coisa. De repente ele esqueceu de jogar fora o papel. Ideia absurda todo mundo recebe o tempo inteiro. O presidente já falou publicamente que nunca leu documento parecido com aquilo.
Apoiadores dele foram para os quartéis questionar o resultado da eleição. Ele não deveria ter falado para elas saírem de lá, dizer que o processo acabou? Não, porque o presidente não mandou ninguém ir. As pessoas têm o direito de se manifestar. O Lula assumiu a Presidência. Então não tem como vincular ele [Bolsonaro] ao dia 8.
O que levou Bolsonaro à derrota em 2022? É uma série de fatores. Eu acho que as narrativas foram criadas contra ele pela mídia lulista. E a nossa comunicação era insuficiente. Então ficava uma versão mais forte do que a outra. Eu acho que nossa comunicação poderia ter sido melhor. Tinha pessoas que achavam que os R$ 600 do Auxílio Brasil era o Lula que estava dando ainda.
Eu acho que pesou também algumas decisões do TSE, que teve tratamento diferenciado entre as campanhas, nos censurando de falar a verdade sobre o Lula, como a relação dele com ditaduras.
E a vacina? Ele nunca se preocupou em fazer política pensando se ia dar voto ou tirar voto dele. Ele achava que, como é uma coisa nova, tinha que comprar a vacina e quem quiser se vacina.
E medidas do ex-ministro Paulo Guedes? Eu acho que o Paulo Guedes é um craque, um gênio. Se não fosse ele, o Brasil não teria tido tanto êxito na parte econômica no combate à pandemia.
A Folha revelou que Guedes tinha o plano de desindexar o salário mínimo. Ele fazia simulações ali no ministério para calcular o impacto de algumas medidas. O que não quer dizer que ele ia fazer. Ele fala que não tinha essa intenção. Ele fazia estudos, simulações. Alguém lá pegou e divulgou com essa narrativa, o que atrapalhou [a campanha].
O ex-presidente se vacinou ou não? Ele diz que não se vacinou. É mais uma coisa polêmica. Você vê como é um revanchismo por parte do governo Lula, você abrir a intimidade da pessoa.
Você acha que isso é intimidade? Total. Vacina toma quem quer.
Recentemente foram revelados casos como o das joias, a devassa da Receita em desafetos de Bolsonaro e o caso da Abin. A forma como está sendo comunicado é só para tentar desgastar o Bolsonaro porque a verdade sempre aparece. Em relação à [devassa da] Receita, eu fui vítima disso. Pedi que a Receita investigasse quem foi que tinha feito isso comigo e a narrativa criada foi que eu usei a Receita para me beneficiar.
Então, eu repudio esses acessos ilegais e o uso dessas senhas invisíveis para fuxicar a vida dos outros. Se acessou a conta do Paulo Marinho, do [Gustavo] Bebianno [ex-ministro de Bolsonaro], de não sei mais quem que em algum momento rompeu com a gente politicamente, essas pessoas têm que ser punidas também, como eu estou buscando que quem fez isso comigo também seja punido.
Mas havia interesse do governo nisso? A gente ficou sabendo pela imprensa também sobre esses acessos. A matéria tem uma lista de pessoas, entre elas Paulo Marinho, [Gustavo] Bebianno. Eu acho que eu estou nessa relação. Como é que eu posso concordar que façam com os outros o que eu não quero que façam comigo?
Mas os três casos (joias, Receita e Abin) não passam uma imagem de que o governo usou a máquina pública em benefício próprio? A imagem que está sendo criada é pela imprensa lulista. Se fossem apurar os fatos, iriam apurar que é o que estou falando, pois também fomos vítimas. O caso das joias é a mesma coisa. A Michelle pegou essa joia? Ela está usando?
O sr. chegou a ser denunciado por suposto esquema de desvio de recursos dos salários de seus assessores quando era deputado estadual da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), caso conhecido como “rachadinha”. Seus negócios imobiliários também foram alvo de investigação, assim como houve denúncia de lavagem de dinheiro. As provas foram anuladas porque eram absurdas. O Ministério Público me acusava de lavar dinheiro, porque qualquer real que eu recebesse na minha loja em espécie seria lavar dinheiro. Você conhece algum comércio em que a pessoa não paga cafezinho, um chocolate em dinheiro? Me acusaram por causa disso.
Infelizmente tem algumas pessoas dentro do Ministério Público, não estou criticando a instituição em si, mas alguns indivíduos, que veem aí a oportunidade de aparecer ou de fazer uma perseguição político- ideológica. E aí foi o que aconteceu.
O sr. comprou uma mansão de R$ 6 milhões. Antes, o sr. disse que o negócio foi realizado com dinheiro que ganhou como empresário. Depois, fez menção a recursos recebidos como advogado. Por que mudou de versão? Não mudei de versão. Algum parlamentar da oposição entrou com uma ação contra mim aqui no TJ [Tribunal de Justiça] do Distrito Federal questionando o empréstimo que eu tomei no banco para financiar a casa. Então, eu sou devedor do banco.
Eu expliquei para o juízo que minha renda hoje vem de 20 anos na vida pública, já tive empresa e estou começando a advogar. Eu não falei que eu comprei a casa com essa renda, porque na época eu não tinha renda de advocacia ainda. Mas pegaram isso da minha resposta, distorceram.
A questão da advocacia é que a Folha foi atrás [e não havia registro de serviços prestados na época]… Pode procurar agora que já tem mais um negocinho [ganhos] lá, que daqui a pouco fica bom.
No DF ou no Rio? Qualquer lugar que não tenha a administração pública envolvida eu posso ser advogado. Eu estou aqui em Brasília. Eu prefiro tratar daqui. Mas são pouquíssimas causas.
O que vai acontecer quando Bolsonaro voltar ao Brasil? Para mim, ele tem que voltar às bases [eleitorais], e ajudar na organização das eleições municipais, que são importantes para um possível passo em 2026 de novo de candidatura à Presidência. Então tem que se dedicar cada vez mais à política.
Quando ele desembarcar, vai haver algum ato, desfile? Pode ser parecido com o que sempre foi né. Uma coisa espontânea.
E em relação à segurança dele? Nossa preocupação maior não é com a prisão dele ou com a inelegibilidade, porque não tem motivo nenhum para isso. Agora, como ele está com a segurança dele reduzida, eu tenho essa preocupação, como filho, de alguém atentar contra a vida dele mais uma vez. Tenho medo de matarem ele.
Ele tem esse receio também? Não, estou falando de mim.
Como será a relação com o novo governo Lula? Pode ter um assunto ou outro que, se for importante para o brasileiro, vai ter convergência. Tributária, por exemplo, é convergente, mas depende do que vai ser apresentado. Jamais vou fazer uma oposição irresponsável, mas, por enquanto, nada de bom chegou aqui [no Congresso].
Raio-X | Flávio Bolsonaro, 41
Nascido no Rio de Janeiro, é advogado, formado em direito pela Universidade Cândido Mendes. Foi deputado estadual por quatro vezes, de 2003 a 2018, quando foi eleito para o primeiro mandato como senador da República. Disputou a Prefeitura do Rio em 2016 e acabou em quarto lugar, perdendo para Marcelo Crivella (Republicanos). É o mais velho dos cinco filhos de Jair Bolsonaro (PL).