Um dos alvos do suposto plano de ataques do PCC contra autoridades brasileiras, o promotor paulista Lincoln Gakiya está no topo de uma lista de sentenciados à morte pela facção, os chamados “decretados”, segundo os serviços de inteligência do Governo de São Paulo.
Coordenador do principal grupo do Ministério Público de combate ao crime organizado, Gakiya assumiu esse posto em 2018, quando assinou os pedidos de transferência de integrantes da cúpula da facção para o sistema federal —entre eles o de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, apontado como principal chefe do grupo.
Antes mesmo de o pedido ser acatado pelo Judiciário, os órgãos de inteligência do governo paulista detectaram a fúria de criminosos contra o promotor. Tal descontentamento ficou materializado em uma carta aprendida em dezembro daquele ano, com uma ordem da cúpula para matá-lo.
A mensagem foi encontrada com duas mulheres que deixavam a Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, no interior de São Paulo, onde ainda estavam os principais chefes do PCC. Nessa carta, revelada pela Folha, também havia o nome do coordenador de presídios da região, Roberto Medina, como outro alvo e integrante da lista de “decretados”.
Ao menos mais duas mensagens com teor semelhante foram apreendidas pela polícia no sistema prisional paulista, uma delas em 2020, na penitenciária de Mirandópolis (594 km de SP), quando os chefes já estavam no sistema federal. A carta tinha cobranças para a morte dois e foi encontrada com um detento que falaria com um advogado dele.
Segundo integrantes dos serviços de inteligência, Gakiya tomou o primeiro lugar de mais odiado pelo PCC do ex-secretário da Segurança Pública Antonio Ferreira Pinto. Até 2018, Ferreira Pinto liderava tal lista por causa de ações letais da PM contra membros da facção, realizadas durante a gestão dele (de março de 2009 a novembro de 2012).
O ex-secretário continua na lista, mas estaria atrás de Medina. Todos contam, porém, com escolta policial. O grupo que protege o promotor já chegou a motivar queixas de vizinhos do condomínio fechado onde ele mora, no interior do estado, devido à movimentação intensa.
Os motivos que levariam Sergio Moro a entrar na lista do PCC ainda são alvo de análise por parte de integrantes das forças de segurança de São Paulo. Isso porque, até o final de 2022, o nome do ex-juiz e senador pela União Brasil não constava de lista dos serviços de inteligência paulista sobre os “decretados”.
Isso enfraquece a tese de que ele poderia ter entrado na mira da facção criminosa por ter participado da transferência de presos ao sistema federal em 2019.
Em outubro de 2022, o promotor Lincoln Gakiya chegou a rebater a afirmação, feita pelo ex-juiz em uma entrevista, de que a transferência de Marcola teve participação de Moro.
“Não há e nem poderia haver nenhuma ingerência do governo federal, seja através do presidente Bolsonaro, seja através do ministro Moro nessa remoção, até porque, como já mencionei, não lhes cumpria fazê-lo. Portanto é mentirosa a afirmação de Moro que após dois meses de governo eles ‘determinaram’ a remoção do Marcola para o sistema federal”, disse em mensagem à Folha.
O promotor afirmou que coube ao Ministério da Justiça somente providenciar a logística para a remoção dos presos, em cumprimento à ordem da Justiça estadual. “Enfim, foi exatamente isso que aconteceu. Nos entristece saber que políticos e até um ex-juiz alterem a verdade para tentar obter algum ganho político dessa história. No final dessa história, fiquei com o ônus da operação, pois o PCC sabe que sou o único responsável por ela, e os políticos, com o bônus”, afirmou.
Integrantes do Ministério Público de São Paulo envolvidos na ação desta quarta (22) afirmam que o plano de ataque contra autoridades seria um desdobramento da ação investigada pela PF que resultou na operação Anjos da Guarda, no final do ano passado, que teria desmantelado um suposto plano de resgate de líderes de organização criminosa presos nas penitenciárias federais.
Como não conseguiram resgatar Marcola, o principal alvo do “plano A”, tentariam um “plano B”: atacariam e sequestrariam autoridades como forma de conseguir liberá-lo em uma “troca de reféns”.
A dimensão do suposto plano de ataque do PCC contra autoridades é vista com ressalva por integrantes da cúpula da segurança paulista, assim como na operação Anjos da Guarda.
Na época, integrantes da PM, Polícia Civil e Secretaria da Administração Penitenciária ouvidos pela Folha afirmaram não ter detectado nenhuma movimentação da magnitude de um plano de regaste do chefão do PCC.