É perto da hora do almoço em um dia de sol em Londres. Faz frio, então me sento do lado de dentro do restaurante. A mesa é em frente à fachada de vidro e vejo que na varanda há duas mulheres com carrinhos de bebê e cachorros. Minutos depois chegam mais duas, cada uma com um carrinho e um cão. Tentam tomar café enquanto uma faz o filho dormir e outra dá uma banana amassada para a criança. Ao meu lado, concentrado, um homem digita no laptop.
No meu pensamento utópico, tento não criar estereótipos e acreditar que elas são executivas e não estão falando só de filhos, mas também sobre suas carreiras incríveis e que o homem pode estar fazendo a lista do supermercado, por que não? Mas, sabendo da realidade, é difícil que seja o caso. No Reino Unido, é muito caro ter babá e o serviço de creches públicas é considerado insuficiente. Quem paga o preço são elas, se afastando do mercado de trabalho.
Sempre tive o bom exemplo dentro de casa, com uma mãe que me mostrou que trabalho e dedicação geram independência e aumentam o valor das minhas conquistas. Nunca sei direito como me sentir quando chega o Dia Internacional da Mulher. Hesito se devo escrever sobre o tema e ser acusada de chata, fraca ou até defensora de ideias com as quais não concordo.
Mas se o dia foi criado em nome de uma luta por direitos, existe porque ainda é preciso falar sobre desigualdade. E como vejo aquela cena do café se repetir tantas vezes, decido que sim. Esta não é uma coluna acusatória, muito pelo contrário. É uma forma de estender a mão aos homens e pedir ajuda. Precisamos de vocês.
Você desejou feliz Dia da Mulher para alguém nesta semana? Se sim, saiba que adoramos palavras carinhosas e sei que a intenção foi boa, mas necessitamos mesmo é de ação. E uma coisa não exclui a outra, sabe?
Será que os mesmos que mandaram mensagens para mulheres no último 8 de março dão às suas funcionárias salários e oportunidades iguais aos de homens na mesma função, colocam-nas em cargos de chefia, valorizam as que voltam da licença-maternidade, repudiam discursos machistas no grupo de WhatsApp dos amigos, dividem tarefas domésticas com suas parceiras sem elas terem que pedir?
Falando de esporte, ainda somos nós que precisamos escancarar portas que são fechadas na nossa cara. Graças à luta das atletas ao longo dos anos vieram algumas vitórias, desmistificando temas como gravidez e menstruação.
As Olimpíadas de Paris em 2024 terão pela primeira vez o mesmo número de homens e mulheres competindo, sendo que os jogos da Era Moderna começaram em 1896.
A elite do futebol inglês feminino só começou a pagar nesta temporada licença-maternidade com 100% do salário. Jogadoras do West Brom passaram a usar calções azul-marinho em vez de branco, porque ficavam desconfortáveis quando menstruadas. Homens que trabalham com esporte não são obrigados a saber disso, mas podem se interessar em perguntar e ouvir.
Federações de futebol da Austrália e da Nova Zelândia, anfitriãs da próxima Copa do Mundo feminina, e craques como Alex Morgan pedem que a FIFA não deixe a Arábia Saudita –que não respeita em nada os direitos das mulheres– patrocinar o torneio, algo não confirmado, mas visto como possível.
Sportswashing compra muito, mas talvez não tudo.
Não queremos continuar falando sozinhas. Em uma sociedade mais igualitária, todo mundo sai ganhando.
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